TECNOLOGIA
Brasil é o 2º país do mundo que mais tem donos de NFTs
A recente desvalorização das criptomoedas, por conta do cenário macroeconômico de inflação e juros altos, e as discussões regulatórias têm penalizado o ecossistema financeiro considerado base para a Web3. Mesmo assim, o período de baixa não impede o agito no mercado de NFTs (non fungible token, em tradução livre, token não fungível), que ganha tração por meio de novos negócios dentro e fora do país.
Comercializados através de uma criptomoeda baseada em blockchain, tecnologia que registra transações de forma descentralizada, os NFTs são itens colecionáveis digitalmente e de propriedade única. Estes ativos digitais seguem em expansão, tanto com vasta criação de novos tokens por empresas e artistas digitais, quanto pelo aumento de compradores desses componentes.
E o Brasil está na dianteira do processo de adoção desses ativos digitais desde o ano passado. O país ocupa o segundo lugar no ranking global de usuários de NFT, segundo a consultoria alemã Statista, ficando atrás somente da Tailândia e à frente de países como Estados Unidos, China, Canadá e Alemanha.
Cerca de 5 milhões de brasileiros possuem ao menos um NFT, o que representa 2,33% da população do país.
Na avaliação de especialistas, a grande adesão aos NFTs em países como Brasil e Tailândia pode ser explicada por alguns fenômenos.
Entre eles está o crescimento dos jogos baseados em blockchain no modelo play-to-earn (jogar para ganhar, em tradução livre), nos quais jogadores recebem recompensas em NFTs com base no seu desempenho e podem não só negociá-los dentro do próprio jogo como convertê-los em moedas fiduciárias através de exchanges (corretoras especializadas em criptoativos).
Experiências no varejo
Outro movimento importante é o de venda de NFTs pelos clubes de futebol brasileiros, que desde o ano passado ampliam sua receita e firmam um novo meio de engajamento com a torcida. A compra desses ativos digitais por grandes jogadores e artistas também ajuda no conhecimento da expressão e pode influenciar a decisão do consumidor.
Apesar do período de baixa no segmento de criptoativos, há praticamente um consenso de que o mercado é promissor. Isso porque, a cada ano, mais pessoas se abrem para o ecossistema de ativos não fungíveis e criptomoedas.
As receitas globais geradas por NFTs devem crescer 439% até 2026, em relação a 2021, segundo o relatório da Statista. Com visão de médio e longo prazo, empresas estrangeiras e brasileiras já vão além do hype e utilizam essa tecnologia em diferentes segmentos.
É o caso da agência R/GA que atua no mercado norte-americano há 45 anos e tem se especializado na criação de experiências imersivas quando o assunto é metaverso e NFTs.
A consultoria de inovação, que possui 15 escritórios ao redor do mundo, sendo um deles em São Paulo, criou uma experiência virtual para os consumidores da Volleback, marca de roupas britânica.
Usuários do metaverso Decentraland poderiam visitar a loja virtual da varejista, experimentar uma jaqueta por meio de seu avatar e comprá-la como um NFT por meio da MANA, a moeda baseada em blockchain da plataforma. O dono da jaqueta virtual também poderia convertê-la em jaqueta física ao realizar uma compra pelo site da marca.
“Toda a discussão sobre Web3, NFT e metaverso está muito presente nas conversas com os clientes e prospects (potenciais), que procuram formas de dar passos em direção a isso. Apenas começamos a explorar as possibilidades”, conta Edson Sueyoshi, vice-presidente de Tecnologia e Produção da empresa.
Mercado imobiliário
Os tokens não fungíveis também começam a ganhar espaço no mercado imobiliário. A startup netspaces, que atua empregando tecnologia para viabilizar transações de imóveis de forma digital, já utilizou NFTs como garantia para operações de financiamento imobiliário. A primeira negociação ocorreu em março deste ano no valor de R$ 129 mil.
Jonathan Doering Darcie, diretor de Jurídico e Produto da empresa, explica que o token do NFT possui o conjunto de direitos do imóvel específico e funciona como uma garantia para a compra de um apartamento. Na prática, troca-se o objeto de garantia, que normalmente é um imóvel, por um NFT avaliado no mesmo valor.
O executivo afirma que esse processo reduz de semanas para minutos o tempo de transação de um imóvel, além de garantir uma operação mais segura por conta da rede blockchain e por ampliar o acesso, seja às pessoas com perfis de renda incompatíveis com os modelos das transações tradicionais ou estrangeiros, que podem ter dificuldades para acessar o mercado imobiliário brasileiro.
“Realizamos duas operações até o momento, que constituíram o nosso esforço de teste. Em vista dos resultados que obtivemos, estamos em discussão com alguns dos maiores bancos e credtechs do Brasil para implementarmos essa solução em escala”, revela Darcie.
O setor de recursos humanos também já utiliza o NFT para embasar novos modelos de negócios. A Chiefs.Group, empresa que conecta executivos e investidores a startups, lançou em março a primeira plataforma em blockchain para gestão de talentos da América Latina.
O sistema, desenvolvido em parceria com a OnePercent, permite que profissionais e empresas se conectem e estabeleçam smart contracts (contratos digitais autoexecutáveis) e realizem transações instantâneas por meio de NFTs. É uma carreira profissional digitalizada.
Cristiane Mendes, CEO da Chiefs.Group, diz que já foram emitidas 50 carteiras digitais para executivos, de um total de 600 executivos que estão à espera de suas carteiras. O montante emitido em token já chega a R$ 11,3 milhões.
O custo de emissão dos NFTs é de 1% sobre o valor de talento emitido. Assim, se um executivo deseja emitir R$ 100 mil de seu talento para o mercado, investirá R$ 1 mil para a criação dos tokens e disponibilização em sua carteira.
“Temos convicção de que o futuro da área de recursos humanos será em blockchain por todo o seu potencial de transparência, garantia de reputação e possibilidade de pagamentos de forma mais ágil”, afirma Cristiane.
A fim de disseminar o potencial das NFTs e atrair público para conhecer a cena de artes digitais, um grupo de especialistas brasileiros realizou o primeiro evento internacional inteiramente dedicado ao universo dos tokens não fungíveis.
Sediado no Parque Lage, o NFT.Rio atraiu 10 mil pessoas entre 30 de junho e 3 de julho, que puderam ver uma exposição gratuita com explicações sobre essa nova economia, além de trabalhos digitais de mais de cem artistas — do Bored Apes Yacht Club (coleção de NFTs da Ethereum) a Gilberto Gil.
Investimento pede cautela
A primeira edição do NFT.Rio também pôde ser visitada on-line de qualquer lugar do mundo através de uma réplica do Parque Lage no metaverso. Marcus Menezes, fundador da coleção de NFTs CryptoRastas e um dos organizadores do evento, já planeja a segunda edição, em 2023.
Apesar da expansão desse segmento no país, especialistas afirmam que é preciso estar atento a alguns riscos assumidos no investimento em NFTs por se tratar de um mercado ainda não regulado, o que pode favorecer o surgimento de bolhas ou fraudes por golpistas que se aproveitem do desconhecimento do cidadão.
“A pessoa que decide aplicar recursos em NFTs precisa se informar muito bem sobre o que exatamente está sendo comprado, quem está vendendo, se existe alguma possibilidade de saída do investimento, além de se certificar que realmente entendeu as características do ativo comprado”, explica João Manoel de Lima Junior, coordenador do Núcleo de Estudos Avançados de Regulação do Sistema Financeiro Nacional (NEASF) da FGV Direito Rio.
Fonte: IG TECNOLOGIA