MUNDO
“Revolta da toalha” enfrenta privatização de praias gregas
Quem for a uma praia na Grécia hoje em dia terá dificuldade para encontrar um lugar ao sol na areia para estender uma canga ou uma toalha. Elas estão tomadas por cadeiras de aluguel, que deixam pouco espaço vazio para quem deseja desfrutar sem pagar.
Nas praias de todo o país, fileiras e mais fileiras de espreguiçadeiras e guarda-sóis idênticos bloqueiam a visão do mar. Eles foram colocados por donos de hotéis e de quiosques, que às vezes cobram preços extorsivos. Uma espreguiçadeira de luxo na ilha de Paros, nas Cíclades, pode custar até 120 euros (R$ 650) por dia.
E não se trata apenas de falta de espaço. Em algumas regiões turísticas da Grécia, pessoas que não querem ou não podem pagar os altos preços de aluguel das espreguiçadeiras não conseguem nem entrar nas praias.
Na ilha de Paros, os moradores locais estão indignados e começaram a reagir para “recuperar a praia”. Um movimento popular conhecido extraoficialmente como “movimento das toalhas” está protestando contra a privatização ilegal das praias de lá e de outras ilhas gregas.
Direito à praia
“Defendemos o direito dos cidadãos e visitantes de nossa ilha de ter livre acesso às praias que amamos”, escreveu o Movimento por praias livres dos cidadãos de Paros em sua página no Facebook.
“O verão grego é parte de nossa alma, é parte de nossa identidade: não vamos deixar que ninguém o tire de nós!”
Houve uma onda de solidariedade nas mídias sociais, com mensagens de apoio e conselhos chegando de todo o país.
A mídia grega apelidou o protesto de “a revolta das toalhas de praia”, mas Konstantinos Bizas, prefeito de Paros e da ilha vizinha de Antiparos, prefere se referir à iniciativa pelo nome “movimento por praias livres”. Afinal, é esse o objetivo do movimento: manter as praias da ilha abertas ao público.
“Por lei, apenas 50% do espaço em uma praia pode ser alugado para exploração privada; os 50% restantes devem permanecer livres e abertos. No caso de uma área de conservação, apenas 30% podem ser alugados”, disse ele à DW.
Paros é a terceira maior ilha das Cíclades e está situada bem ao lado da ilha maior de Naxos. Tem uma população de 14 mil habitantes e mais de 700 operações turísticas que oferecem 25 mil leitos. Outros 10 mil leitos estão disponíveis pelo Airbnb.
De acordo com as estatísticas oficiais, cerca de 750 mil turistas visitaram a ilha no ano passado, atraídos por suas inúmeras e belas praias, das quais dez são especialmente populares. Bares, cafés e restaurantes foram abertos nessas praias e gradualmente se expandiram, ocupando o espaço da areia.
Lei da orla não está sendo aplicada
O professor aposentado Christos Georgousis é um dos fundadores da iniciativa, que trabalha em conjunto com a Associação Cultural Archilochos para proteger as praias e garantir o livre acesso ao mar. Ele diz que a situação na ilha saiu do controle, e que há dois anos ninguém monitora se as normas estão sendo cumpridas.
Georgousis decidiu que havia chegado a hora de agir e, no início de junho, convidou representantes do governo e da oposição local para uma reunião para discutir possíveis soluções. Cerca de 200 pessoas compareceram.
No final de julho, ocorreram as duas primeiras manifestações nas praias da ilha. Participaram cerca de 300 e 400 pessoas, respectivamente, e várias seguravam faixas para “retomar a praia”. Os habitantes locais foram acompanhados por estrangeiros que moram na ilha ou a visitam regularmente. Depois disso, os protestos se espalharam para as ilhas de Naxos e Serifos.
“O movimento dos cidadãos não tem como alvo os turistas ou os empresários”, disse o diretor de cinema Panos Kekas à DW. Tudo o que os ativistas querem, enfatizou, é que a lei do país seja respeitada, ou seja, que metade de todas as praias permaneça livre de guarda-sóis e espreguiçadeiras para que os moradores e turistas possam desfrutar do mar e da natureza.
Os integrantes do movimento vêm de diversos partidos, estilos de vida e faixas etárias, diz o professor de ensino médio Tasos Kasapidis: “Os membros do movimento publicaram dados obtidos com as autoridades na internet e descobriram que apenas 7,5 mil metros quadrados de praia em Paros foram alugados a empresários, mas que eles ocuparam um total de 18,5 mil metros quadrados.”
A privatização crescente das praias da Grécia é um problema não apenas em Paros, mas em todo o país. Por toda parte, hotéis e quiosques de praia não estão se restringindo às áreas que alugam e se expandem ilegalmente. Eles têm conseguido fazer isso porque as autoridades não fiscalizam.
De acordo com a legislação grega, as praias são propriedade pública e só podem ser alugadas pelas autoridades locais ou outras autoridades competentes em circunstâncias específicas. Mas as autoridades nem sempre realizam as inspeções necessárias, seja porque não querem perder apoio ou porque determinados empresários são parentes ou amigos de políticos locais. Seja qual for o motivo, o resultado é que um pequeno grupo de pessoas está lucrando às custas de uma grande parte da sociedade local.
Protestos estão dando frutos
Apesar disso, o Movimento por praias livres dos cidadãos de Paros obteve conquistas em apenas dois meses. O ministro das Finanças da Grécia, Kostis Hatzidakis, prometeu na semana passada intensificar as inspeções e identificar operações ilegais, e disse que “não entregaremos as praias a ninguém”.
Desde então, os guarda-sóis e as espreguiçadeiras foram retirados da popular praia de Santa Maria, na costa nordeste de Paros, e três empresários foram detidos e denunciados.
Um promotor de Atenas viajará à ilha para avaliar a situação, e uma reunião extraordinária da autoridade local analisará o assunto. De forma merecida, os ativistas comemoraram o seu sucesso organizando uma festa na praia de Santa Maria.