GERAL
Richthofen, Matsunaga e Nardoni: veja como estão locais onde ocorreram crimes
Não importa quantos anos passem, crimes que chocaram ainda assombram os imóveis que foram palco dessas tragédias, seja pelas marcas deixadas no local, seja pela eterna lembrança dos vizinhos. Muitos moradores dessas áreas, no entanto, lutam para esquecer e preferem não tocar no assunto.
O R7 retornou aos locais marcados por alguns dos crimes mais aterrorizantes da história da cidade para conferir como eles estão hoje, em novembro de 2023.
Caso Von Richthofen
As paredes de tijolos marrons e as coberturas de folhagens, divulgadas exaustivamente nos jornais em 2002, não fazem mais parte da antiga casa da família Von Richthofen. A residência, comprada por Manfred em 1998, por R$ 330 mil, possui dois andares com sala, cozinha, banheiros, suítes, escritório, biblioteca, piscina e garagem. O imóvel foi vendido 12 anos após o crime por R$ 1,6 milhão por Andreas, único herdeiro, já que sua irmã, Suzane, foi excluída da herança por indignidade.
Em janeiro deste ano, Suzane deixou o presídio em Tremembé, no interior de São Paulo, após a Justiça conceder progressão da sua pena para o regime aberto.
Ela foi condenada inicialmente a 39 anos de prisão, mas conseguiu diminuir o tempo para 34 anos e quatro meses, com término previsto em 25 de fevereiro de 2038. A primeira vez que Suzane conseguiu a progressão de pena foi em outubro de 2015, quando passou a ter direito a saídas temporárias.
Os novos proprietários, um engenheiro e uma dentista, reformaram a fachada. Mas, mesmo assim, é fácil distinguir a casa das demais no bairro do Brooklin, na zona sul de São Paulo. Agora, a tinta branca pintada por cima dos tijolos tenta esconder as pichações e ofensas a Suzane e aos irmãos Cravinhos, responsáveis pelo assassinato do casal Manfred e Marísia, donos de uma fortuna de mais de R$ 11 milhões.
Através das frestas do portão, é possível ver o mato alto no jardim da casa e sentir o abandono. Vizinhos relataram ao R7 que raramente alguém aparece para checar as condições da casa, que atualmente está desabitada.
Caso Matsunaga
Os pedestres que caminham pela rua Carlos Weber, na Vila Leopoldina, na zona oeste da capital paulista, sabem apontar exatamente qual é o prédio onde Elize Matsunaga matou e esquartejou o marido, Marcos Matsunaga, herdeiro da Yoki, em 2012. Mesmo assim, e apesar do crime ser chocante, 11 anos depois o assunto não parece ser mais tão comentado na região.
Moradores do prédio entrevistados pela reportagem disseram que o tema ainda é um tabu entre os condôminos. “Eu até gostaria de saber mais sobre o caso, mas ninguém mais toca no assunto, é um verdadeiro tabu e ninguém que mora no prédio fala disso”, contou um deles, que preferiu não ser identificado.
Elize Matsunaga está em liberdade condicional desde maio de 2022. Presa em 2012, ela foi condenada a mais de 19 anos de prisão por homicídio doloso qualificado, por impossibilidade de defesa da vítima, além de destruição e ocultação de cadáver.
“Não estava aqui quando o crime aconteceu e nem posso falar sobre o assunto. Tudo que posso dizer é que foi na cobertura do primeiro bloco e que nunca vi ninguém entrando ou saindo daquele apartamento”, contou rapidamente pelo interfone, e de forma desconfortável, o porteiro do prédio.
Embora o local hoje não seja tão procurado, foi a insistência dos curiosos na época do crime que levou a administração do prédio a retirar o nome Roma da fachada, que antes ficava junto ao número 1.376 na portaria. Neste residencial, as coberturas têm 280 m² e custam mais de R$ 2,2 milhões
Ela conseguiu remição de parte da pena ao fazer cursos disponíveis e ler livros no cárcere. Além disso, trabalhou na oficina de costura do presídio, função pela qual recebia o valor de pelo menos três quartos de um salário mínimo.
Caso Isabella Nardoni
Foi pela janela do 6º andar do residencial London, na zona norte de São Paulo, que a menina Isabella Nardoni, de 5 anos, foi arremessada. Atualmente, o prédio aparenta ter as mesmas características daquele fatídico dia: 29 de março de 2008. O azulejo quadriculado azul-marinho ainda cobre as torres do edifício, e a portaria mantém suas grades brancas.
Embora a rua seja bem menos movimentada do que há 15 anos e pareça ter caído no esquecimento da população, o assassinato da criança pelo pai, Alexandre Nardoni, e pela madrasta, Anna Carolina Jatobá, ainda é lembrado com muita dor pelos vizinhos.
Antes de ser jogada pela janela, Isabella foi agredida brutalmente e fraturou o punho. Até hoje, Alexandre e Anna Carolina negam veementemente a participação na morte da menina.
Em 2010, o pai foi condenado a 31 anos e um mês de prisão, enquanto a madrasta recebeu pena de 28 anos e oito meses. Desde 2019, Alexandre cumpre pena em regime semiaberto com direito a cinco saídas temporárias por ano. Anna Carolina obteve regressão de pena e foi para o regime aberto em junho deste ano. O Ministério Público, entretanto, solicitou sua volta à prisão e agora o caso tramita em segredo de Justiça.
Caso Gil Rugai
Localizada em Perdizes, bairro nobre da zona oeste de São Paulo, a rua Atibaia — conhecida por ser tranquila e arborizada — foi palco de um crime que chocou a cidade em 2004.
O seminarista Gil Grego Rugai foi condenado pelo assassinato do pai, Luiz Carlos Rugai, de 40 anos, e da madrasta, Alessandra de Fátima Troitino, de 33. Eles foram encontrados mortos com marcas de tiros dentro da própria casa.
Segundo as investigações, Gil arrombou a porta da residência e disparou quatro vezes contra o pai. Já a mulher foi baleada cinco vezes na porta da cozinha. Um dos tiros atingiu o olho esquerdo e os outros acertaram a vítima pelas costas.
Gil Rugai foi condenado a 33 anos e 9 meses de prisão. Ele está em regime semiaberto desde 2021 e, em 2023, recebeu permissão para frequentar as aulas do curso de arquitetura na universidade Anhanguera, em Taubaté, no interior de SP.
Como não houve manifestação contrária do irmão Léo Rugai, o seminarista tem direito à herança deixada pelo pai. O montante de bens da família, que ultrapassa os R$ 20 milhões, é dividido entre os irmãos e familiares da madrasta.
Hoje, o imóvel da rua Atibaia funciona como uma associação de integração e reabilitação para pessoas com deficiência. A fachada da casa foi reformada: as grades pretas foram substituídas por muro alto. Na portaria, há uma placa identificando a instituição e um interfone.
“Não gostamos que tirem foto. O crime já aconteceu há muito tempo e não tem mais nada a ver com o que é hoje”, comentou um funcionário da instituição que abriu a porta ao R7.De acordo com o homem, a parte de dentro da casa foi adaptada para acessibilidade dos membros da associação, mas as principais estruturas foram mantidas.
Caso Eloá
O bloco 24 da Companhia de Desenvolvimento Habitacional Urbano (CDHU) no Jardim Santo André, no ABC paulista, ficou marcado pelo cárcere privado e a morte da adolescente Eloá Pimentel pelo ex-namorado Lindemberg Alves. Agora, o condomínio é cercado por muros e somente os moradores estão autorizados a entrar no local por um portão estreito e com fechadura. As paredes mantêm a mesma cor de outubro de 2008, data do crime.
Eloá estava em seu apartamento com mais quatro amigos quando Lindemberg, na época com 22 anos, invadiu o imóvel armado e os manteve reféns. Os outros adolescentes foram liberados, mas Eloá ficou presa durante quatro dias. No fim, ela foi baleada pelo ex e morreu.
Os vizinhos preferem não falar sobre o caso. Para muitos, é uma lembrança dolorosa que desejam apagar da memória. Para outros, há o medo de serem cobrados por traficantes da região por atrair a imprensa. “Já faz 15 anos do caso, mas parece que foi ontem. Ninguém deixa a gente esquecer”, diz uma moradora, que não quis se identificar.
Alguns moradores que atenderam a reportagem afirmaram que um buraco na parede do bloco 24, em frente ao apartamento de Eloá, teria sido causado por um dos tiros do criminoso.Atualmente, Lindemberg cumpre pena em regime semiaberto na Penitenciária II de Tremembé, no interior de São Paulo.
Quatro anos após o crime, o homem foi condenado a 98 anos e 10 meses de reclusão e ao pagamento de 1.320 dias-multa, sem o direito de recorrer em liberdade. A defesa recorreu, e a pena foi reduzida para 39 anos e 3 meses de reclusão, com início em regime fechado e pagamento de 16 dias-multa.
Crime da rua Cuba
Era 24 de dezembro de 1988, véspera de Natal. O advogado Jorge Toufic Bouchabki e sua mulher, Maria Cecília, foram mortos em sua residência na rua Cuba, no Jardim América, bairro nobre da zona oeste de São Paulo.
Mesmo após 35 anos do ocorrido, um dos crimes mais violentos da cidade segue sem a identificação do culpado. O principal suspeito pelo assassinato foi, durante muito tempo, o filho do casal, Jorge Delmanto Bouchabki, que na época tinha 19 anos. Entretanto, a autoria nunca foi comprovada.
A casa ficou fechada por 14 anos, vendida em 2002 e reformada pela nova família de moradores. Hoje, a residência possui um imponente portão marrom, de ferro, com o número 109 cravado. Na portaria da residência, a reportagem acionou o interfone e conseguiu conversar com a empregada doméstica.
Pela porta do correio, a mulher contou que trabalha há dois anos para a segunda proprietária do imóvel, após a saída dos primeiros compradores. “Acho que eles não gostaram de ficar morando em uma casa onde ocorreu uma tragédia dessas. Então passaram a casa para frente e venderam para a minha patroa. Não acho tão assustador como os outros dizem. Para mim, é tranquilo, sem clima nenhum”, falou.
Hoje, a rua Cuba é repleta de casarões e conta com a proteção de uma equipe de segurança. A casa possui quartos, banheiros, salas de estar, copa, cozinha, escritório, lavanderia, quintal e garagem. Há cerca de dez anos, o imóvel teria sido comprado pela nova proprietária, que mora com as três filhas gêmeas, a babá e a empregada. Após tantos anos, a residência não é mais tão procurada por curiosos, mas o endereço continua marcado como cenário de um crime ainda não solucionado.
Castelinho da rua Apa
O castelinho da rua Apa guarda o segredo de um dos crimes mais misteriosos da cidade de São Paulo. A mãe Maria Cândida e os dois filhos, Álvaro e Armando, da poderosa família Guimarães Reis, foram mortos a tiros na residência, localizada no centro de São Paulo, em maio de 1937 — dois meses após a morte do pai, Virgilio.
Reza a lenda que os irmãos teriam entrado em uma briga por divergências sobre os rumos do negócio da família e da herança. No dia do crime, Álvaro teria atirado contra o irmão e acertado também a mãe, que tentava apartar a briga. Ao ver o que tinha feito, o homem cometeu suicídio. Porém, a hipótese nunca foi confirmada pela perícia e as circunstâncias levaram muitos a acreditar que não foi exatamente isso o que aconteceu.
O imóvel ficou sem herdeiros. Abandonado durante anos, ele foi invadido por moradores de rua e usuários de droga, se tornou um ferro-velho e só em 1996 foi cedido pela administração pública ao Clube de Mães do Brasil, instituição filantrópica voltada a pessoas em situação de vulnerabilidade. Por unanimidade do Congresso, a associação conseguiu verba para a restauração do prédio histórico, que se iniciou em 2015 e terminou em 2017.
Totalmente reformado, atualmente o castelinho mantém suas mesmas características arquitetônicas na parte externa. No entanto, a gerente administrativa do Clube das Mães, Claudineia Viana, conta que nada da antiga casa está presente no interior do castelinho. “Estava só a carcaça e nada foi aproveitado. Agora ele está vazio, não há móveis lá dentro porque não conseguimos resgatar a história de como era cada cômodo. Hoje temos salas de reuniões usadas pela instituição e quartos para atendimento médico e psicológico de quem nos procura”, disse.
Em relação às mortes no castelinho, Claudineia diz não ter resposta certa. “Não tem ninguém para contar essa história. Na internet existem milhões de pessoas dando depoimentos, livros, caça-fantasma. Mas ninguém sabe realmente o que aconteceu. Então eu falo para as pessoas que vêm aqui dentro: ‘O que você imagina que pode ter acontecido?’ Você mesmo cria a sua história, já que o fato concreto nem a perícia sabe”.
Para o ano que vem, a instituição pretende fazer um museu no castelinho da rua Apa, que vai contar a história da associação, do bairro e da família Guimarães Reis.