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RIO BRANCO
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GERAL

‘Paguei R$ 183 mil para proteger minha filha do pai pedófilo’

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Quando o pai de sua filha foi preso por abuso sexual infantil, Bethan* ficou horrorizada ao descobrir que ele ainda poderia ver a criança depois de ser libertado. Era um risco que ela não estava disposta a correr.

Quando foi condenado por crimes de pedofilia há alguns meses, o pai da menina recebeu uma ordem que o proibia de ter qualquer contato futuro com crianças – mas essa proibição não se aplicava à própria filha.

Ele e Bethan eram casados quando a criança nasceu e, portanto, ele ainda mantinha os direitos parentais. Com isso, podia ao menos decidir sobre a saúde, a educação e as condições de vida de sua filha.

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Por tudo isso, Bethan estava “muito preocupada” com o que poderia acontecer quando ele sair prisão.

Ela temia que um dia ele pudesse tirar a filha da escola sem seu conhecimento, e a única maneira de recuperá-la fosse por meio da Justiça.

E, enquanto o ex-marido tivesse acesso à filha, ele poderia fazer com ela o que fez com as outras crianças de quem abusou.

“Eu nunca me perdoaria”, diz Bethan.

Com o apoio dos pais, Bethan tomou a difícil decisão de pedir à Justiça que retirasse os direitos parentais do ex-marido e proibisse qualquer contato – direto, indireto e por meio das redes sociais – até a filha completar 18 anos.

Apesar da gravidade dos crimes do seu ex-parceiro, Bethan foi informada de que este processo provavelmente seria difícil.

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Durante o julgamento, ela o descreveu como “manipulador” e disse ter tido medo de que ele conseguisse convencer o tribunal de que estava arrependido.

Ela não teve direito a apoio judiciário e, mesmo antes da primeira audiência, os custos com advogados não paravam de aumentar.

O caso de Bethan foi julgado em uma corte de Direito de família, onde são tratadas as disputas entre pais – muitas vezes envolvendo crianças vulneráveis.

Até recentemente, os casos eram ouvidos em privado, e os jornalistas não tinham permissão para divulgá-los.

Mas, desde janeiro, repórteres credenciados foram autorizados a entrar nos tribunais de Direito de família em Leeds, Carlisle e Cardiff, na Inglaterra, o que permitiu um escrutínio mais minucioso das ações das autoridades locais e dos tribunais, sujeitos a regras rígidas de anonimato.

A BBC News acompanhou o caso de Bethan nos últimos seis meses.

Maior escrutínio dos tribunais

Em uma das audiências no tribunal, Bethan estava sentada atrás de uma divisória para não ser vista.

O pai de sua filha – que não tem advogado – participava por videoconferência da prisão, com a imagem exibida em um telão.

Ele parecia pequeno, sentado atrás de uma mesa comprida, com papéis espalhados à sua frente.

Uma assistente social do Cafcass Cymru, o serviço de aconselhamento do tribunal de crianças e de família do País de Gales, também estava presente.

O ex-companheiro de Bethan disse ao Tribunal que aceitava estar preso por crimes de “natureza gravíssima” e disse que “queria estar presente para sua filha”, caso ela quisesse ter um relacionamento com ele.

Ele tinha escrito cartas para ela todas as semanas, mas, atualmente, ainda não pode enviá-las.

Mais tarde, ele fez o que pareceu ser um apelo sincero: ele é um pai “que ama sua filha sem limites”, disse com a voz embargada.

Para Bethan, foi “simplesmente insuportável” ouvir e “incrivelmente doloroso” tentar se reconciliar com este homem diante “dos horrores pelos quais ele fez aquelas crianças passarem”.

A filha de Bethan é uma das mais de 80 mil envolvidas em processos privados de Direito de família.

Em 2022, o tempo médio do processo de direito de família privado na Inglaterra e no País de Gales era de cerca de dez meses, ou quase 45 semanas.

É um sistema “em crise”, de acordo com a Law Society, a associação profissional de advogados da Inglaterra e do País de Gales.

Mas os direitos dos pais são “absolutos” por lei e só podem ser alterados por meio de ordem judicial, explica Hannah Markham, presidente da Ordem dos Advogados de Direito da Família.

“Mesmo que alguém esteja na prisão por crimes de pedofilia muito graves, eles mantêm a responsabilidade parental”, diz ela, descrevendo Bethan como “corajosa” por ter prosseguido com o processo.

Após a primeira audiência, a assistente social passou algum tempo com Bethan e sua filha e visitou o pai na prisão.

O caso avançou rapidamente, e, três meses depois, Bethan voltou ao Centro de Justiça da Família de Cardiff.

O relatório da assistente social criticava fortemente o ex-marido de Bethan. Nele, ele diz que “lamenta não poder ser o pai que sua filha merece”, antes de agradecer ao tribunal.

Ele disse esperar ser reavaliado quando for solto e solicitou um relatório anual detalhando sobre como está sua filha.

Para Bethan, esse tipo de contato indireto é inaceitável. Quando seu advogado questionou qual o valor que tal relatório teria, o pai interveio.

“Teria um enorme valor para mim”, afirmou.

À medida que o caso avançou, os gastos de Bethan continuaram a crescer.

Para ajudá-la com as taxas, seus pais estenderam a hipoteca de sua casa, algo que “mudará significativamente seu futuro”, mas sua prioridade sempre foi proteger a família.

“Sinto muito pelas pessoas que não conseguem esse dinheiro”, diz o pai de Bethan. “Elas estão em uma situação horrível.”

O caso “tomou conta” da vida da família, mas, comparado a muitos outros processos judiciais de família, avançou rapidamente.

O juiz decidiu que a menina deveria sempre morar com a mãe, enquanto a responsabilidade parental do pai é “completamente restrita”.

Bethan afirmou estar “extremamente aliviada”.

Além dos crimes pelos quais está preso, o juiz disse que o homem também confessou ter assistido a videos de pedofilia com incesto e ter aliciado um jovem vulnerável.

Ele representa “um risco extremamente alto”, afirmou o juiz, que não aceitou o pedido do pai de receber relatórios anuais.

Foi concedida uma ordem de proibição, que tornará mais difícil para o ex-marido de Bethan solicitar a alteração da decisão do juiz assim que ele for libertado da prisão.

Ele será informado se sua filha estiver com uma doença terminal ou se eles se mudarem para um país diferente, mas não onde ela e sua mãe estão.

Para Bethan – que passou horas pesquisando sobre Direito de família e leu muitos relatos de pais que não obtiveram a decisão que esperavam – é um “enorme alívio”.

“Fiquei muito grata”, diz ela.

Os pais de Bethan também estão muito satisfeitos.

“Pela primeira vez em três anos, libertaram a minha filha para poder criar a sua filha de uma forma normal, feliz e saudável”, diz a mãe de Bethan.

“Não podemos explicar o quão doloroso tem sido.”

Além do impacto emocional, a britânica também teve gastos significativos – de mais de 30 mil libras (mais de R$ 183 mil).

A família acredita que outros poderiam evitar processos judiciais igualmente dispendiosos se a lei fosse alterada para suspender automaticamente os direitos parentais de pais pedófilos condenados e apenas restaurá-los se o infrator recorrer à Justiça.

O governo britânico disse à BBC que está “revisando cuidadosamente a abordagem ao acesso dos pais para garantir que todas as crianças sejam mantidas seguras”.

Para Hannah Markham, mudar a assistência jurídica poderia ser uma forma mais rápida e eficaz de permitir que mais pais como Bethan recorressem aos tribunais – e ela espera que este caso sirva de precedente.

“Quanto mais for publicado e falado, mais educará outras pessoas para que saibam que esta é a coisa certa a fazer”, diz ela.

Bethan e seus pais acreditam que a presença de jornalistas em tribunais trouxe mais transparência e será útil para outros no futuro.

A mãe de Bethan diz que a menina agora “pode ter uma infância normal – ela pode estar segura”.

Um dia, Bethan diz que contará à filha sobre o pai e que o fará quando a menina tiver idade suficiente.

*Os nomes dos personagens nesta reportagem foram alterados para proteger sua privacidade.

 

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