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Aos 82 anos, professor leciona há seis décadas e já deu aulas para o próprio filho: ‘Tirou a menor nota comigo’

“Se eu olhar para trás, acho que a coisa mais importante na minha vida foi ter feito essa escolha de ser professor. Eu já tinha essa vocação de estar em sala de aula e ainda tenho isso muito vivo em mim. A sala de aula é a minha paixão.” Mesmo após 60 anos lecionando, é com esse carinho que o professor doutor e desembargador aposentado Clayton Reis, de 82 anos, fala da docência e comemora o Dia do Professor nesta quarta-feira, 15.
Natural de Ubá, município em Minas Gerais, Clayton se mudou ainda criança para o Paraná, onde já viveu em várias cidades do Estado. Atualmente, ele mora com a família na capital Curitiba. Na década de 1960, ele se formou no curso de Química, mas com o objetivo de ser pesquisador. “Sempre fui apaixonado pelas ciências exatas”, lembra, em entrevista ao Terra.
No entanto, ao longo do curso, surgiu uma oportunidade para dar aulas no ensino médio e ele encarou. Foi assim que começou a perceber a vocação e o amor por ensinar. Ao mesmo tempo, ele ainda se formou em Filosofia.
“Eu vi que a minha convivência com a sala de aula era uma coisa muito gratificante e comecei a sentir um desejo de continuar realmente com essa atividade”, afirma o mestre e doutor pela Universidade Federal do Paraná e pós-doutor pela Universidade de Lisboa.
Quando estava prestes a fazer uma especialização em Química, Clayton, porém, decidiu dar um “giro de 180 graus” na carreira: inspirado pelo pai que era juiz, ele descobriu outra paixão, o Direito, e também se formou no curso em 1969. “Comecei a sentir uma atração especial para o Direito mais do que para a Química.”
Ao longo da sua trajetória profissional, Clayton passou em concursos para o cargo de juiz e seguiu na profissão. No entanto, continuou atuando como professor de faculdade. Só no Centro Universitário UniCuritiba, ele trabalha há mais de três décadas. Atualmente, é professor da graduação em Direito e do Programa de Pós-graduação em Direito da instituição.
“Minha carreira como magistrado também está muito ligada à carreira docente. Eu sempre gostei muito da sala de aula, então sempre caminhou junto”, conta.
Aulas para o próprio filho
Casado há 57 anos com Tânia Maris Alberge Reis, que também é professora, e pai de cinco filhos, Clayton coleciona memórias da sala de aula. Entre elas, tem um período que foi muito especial: ele foi professor do próprio filho, Guilherme Alberge Reis, no curso de Direito, em duas matérias.
“Ele foi meu aluno, mas eu sempre tive muito cuidado com uma questão de ética para que os alunos não soubessem disso. Ele também não falava que era meu filho. Dei aula para ele na área de Responsabilidade Civil e em Direito de Família. Ele me chamava de professor”, detalha.
Clayton ainda revela que foi justamente na sua disciplina que Guilherme tirou a menor nota na universidade, que foi 7. “Ele é extremamente dedicado, responsável, tirava notas altas, mas tirou a nota mais baixa comigo”, brinca. “Quando eu corrijo as provas, não vejo o nome do aluno, só identifico quando vou lançar a nota no sistema, aí eu vi”, completa.
O docente conta, porém, que na sessão de colação de grau do filho, fez questão de estar na mesa diretora e entregar pessoalmente o diploma dele, a quem rasga elogios: “Foi muito emocionante saber que meu filho estava terminando o curso. Isso abriu um espaço muito grande para ele fazer uma advocacia de nível altíssimo.”
Outra parte da docência que Clayton gosta de recordar com muito carinho é ter sido patrono, paraninfo, nome de turma e por ter recebido inúmeras homenagens dos alunos formandos.
Amor à sala de aula
Mesmo após tantos anos, Clayton continua lecionando com brilho nos olhos, considera a docência uma “missão extraordinária” e um “processo de libertação” do ver e da mente dos alunos e nem pensa em se aposentar na carreira.
“A sala de aula é uma oportunidade de repassar informações que são importantes e de, sobretudo, conscientizar os nossos alunos de suas responsabilidades, de suas ações, e preparar as pessoas para viver em sociedade”, afirma.
“Você não faz ideia da satisfação que eu tenho quando saio e encontro algum aluno, no shopping, por exemplo, e ele vem, me dá um abraço e fala que minhas aulas foram inesquecíveis, que a vida mudou, é muito gratificante. Em razão da minha idade, a gente começa a olhar para trás e se perguntar se valeu a pena. Valeu muito a pena. A escolha que eu fiz é muito significativa.”
