Por que os bebês das novelas são tão grandes?

Os gêmeos de Solange (Alice Wegmann) e o bebê de Maria de Fátima (Bella Campos) nasceram no remake de Vale Tudo (Globo). Nas redes sociais, os herdeiros chamaram a atenção pelo tamanho. De acordo com telespectadores, as crianças eram grande demais para tão pouco tempo de vida. No entanto, não se trata de uma gafe da emissora –há uma razão legal e burocrática para isso.

Segundo a Constituição Federal, menores de 16 anos são proibidos de trabalhar, exceto na condição de aprendizes, a partir dos 14. Contudo, a Convenção nº 138 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil, permite a participação de crianças e adolescentes em obras artísticas, como comerciais, novelas e filmes. Essa autorização é fundamental para viabilizar o trabalho remunerado de menores no audiovisual e deve ser aprovada por um juiz responsável por cada caso. Logo, existe um tempo de espera para que o processo transite no judiciário até que a permissão formal seja disponibilizada.

“Não basta apenas a autorização dos pais. A criança ou adolescente precisa de uma licença ou alvará de um órgão competente autorizando o trabalho artístico, para aquela situação individual específica”, explicou a advogada trabalhista Fernanda Perregil, sócia do DSA Advogados, ao Terra. A especialista destacou ainda que, para cada atividade artística que o menor se propor, ele deve obter uma nova autorização judicial.

Para além disso, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) também estabelece que a atividade não pode prejudicar o desenvolvimento psicológico ou físico da criança, nem sua frequência escolar. Além disso, são proibidos trabalhos noturnos, perigosos ou insalubres para menores de 18 anos. Segundo Fernanda Perregil, esse conjunto de restrições pode explicar a ausência de recém-nascidos nas telinhas.

“A autorização judicial depende da demanda do Judiciário, mas, pela minha experiência, não costuma ser demorada. Acredito que a ausência de recém-nascidos nas novelas esteja mais ligada à questão de saúde, já que, antes dos três meses, as crianças ainda não receberam as vacinas obrigatórias. Portanto, sua presença em um set representa um risco à integridade física”, afirmou ela.

Questionada sobre os limites de horas de trabalho, ela voltou a citar o ECA, enfatizando que não há regra específica para isso ainda, mas que a carga horária não pode causar danos físicos ou psicológicos à criança. Caso o menor esteja em idade escolar, a atividade também não pode comprometer os estudos.

Nos Estados Unidos, a legislação é mais detalhada. Regras rígidas definem quanto tempo cada criança pode permanecer no set. Em dias sem aula, por exemplo, elas podem ficar mais tempo, desde que acompanhadas pelos pais. Na Califórnia, a convenção prevê que menores de 6 meses a 2 anos trabalhem apenas 20 minutos por dia; de 2 a 6 anos, até três horas; de 6 a 9 anos, quatro horas — e assim por diante.

Diretores preferem bonecos

Em abril de 2017, o colunista Leo Dias, então no jornal O Dia, noticiou que um bebê de três meses desenvolveu um quadro de hipotermia durante as gravações de A Força do Querer (Globo), realizadas próximo a um rio. Segundo ele, funcionários envolvidos foram suspensos. Desde então, autores e diretores passaram a se posicionar contra a presença de bebês muito pequenos em produções audiovisuais.

A diretora de novelas da Globo Maria de Medicis, por exemplo, defendeu o uso de crianças mais velhas nas gravações. “Muita gente reclamando do tamanho dos bebês em novelas. Hoje em dia, a lei é muito mais rigorosa com relação à participação deles. E isso é ÓTIMO!”, escreveu ela em seu perfil do X, na época, ainda chamado de Twitter.

“Um set tem, no mínimo, 60 pessoas, ar-condicionado, poeira… Portanto, é um ambiente onde um bebê de menos de 3 meses não deve transitar. Sempre achei um absurdo ter bebês tão pequenos num set. É perigoso. Mas hoje em dia isso virou lei. Finalmente, os bebês têm limite de tempo e idade para gravação”, completou.

A autora Gloria Perez, responsável por A Força do Querer, também já se manifestou sobre o tema: “O bebê tem 2 meses. Por mim, seria maior! Amo quando usam bonecos. Antes de pensar em realismo, lembrem que ali está uma criança — como o filho de vocês”, publicou ela na mesma plataforma.