ESPORTES
Espanha se torna a maior campeã da Euro e recarrega esperanças por um mundo mais inclusivo
Ao se consagrar tetracampeã da Eurocopa neste domingo, depois de vencer a Inglaterra por 2 a 1, em Berlim, a Espanha deixa uma mensagem não só por ter jogado o melhor futebol do torneio, mas, principalmente, por ter como protagonistas dois jogadores negros e filhos de imigrantes africanos.
Em uma imagem carregada de simbolismo, Lamine Yamal e Nico Williams festejaram o título abraçados, de joelhos no gramado, assim que soou o apito final. Fosse em outros tempos, a presença de atletas negros em uma seleção historicamente formada por brancos poderia ser associada ao fenômeno de jogadores estrangeiros naturalizados, como Marcos Senna, volante nascido no Brasil que venceu a Euro pela Espanha, em 2008.
Hoje, porém, a distinção obrigatória é a de legítimos cidadãos espanhóis. Tanto Yamal quanto Williams nasceram na Espanha, foram revelados por clubes da Espanha, atuam no futebol da Espanha e decidiram defender a Espanha. Ainda que muitos europeus relutem em reconhecer direitos básicos de filhos de imigrantes negros, a nacionalidade das grandes revelações espanholas está expressa no orgulho que sentem em representar o país.
No começo da Euro, Vicente Del Bosque, um dos técnicos mais vitoriosos pela seleção e supervisor da Federação Espanhola, chegou a declarar que a equipe se tornou melhor com “dois imigrantes”. Ele não se referia aos zagueiros Laporte e Le Normand, ambos nascidos na França e naturalizados espanhóis, mas sim a Nico Williams e Lamine Yamal.
Para a maioria branca europeia, imigrantes se restringem às pessoas negras com raízes africanas, repelidas por políticas agressivas antimigração. Uma forma explícita de racismo abrandada pela suposta defesa do nacionalismo e das tradições culturais. No entanto, ao longo desta Euro, racistas espanhóis como os que atacam Vini Jr. de maneira sistemática tiveram de engolir aos triunfos alcançados, em boa medida, graças ao talento de dois jovens pretos a serviço da Fúria.
Contra a Inglaterra, Williams abriu o caminho da vitória após aproveitar a assistência de Yamal, em chute certeiro de primeira. Apesar do empate inglês, a Espanha manteve seu estilo de jogo ofensivo, buscando tabelas e infiltrações pelo meio. O craque do Barcelona, que completou 17 anos na véspera da decisão, teve duas boas chances, mas parou no goleiro Pickford.
Embora o gol do título espanhol tenha sido anotado por Oyarzabal, que substituiu Morata no segundo tempo, Williams foi o melhor jogador da final. Participou das principais jogadas de ataque, sobretudo quando se deslocava da esquerda para o meio. Por sua vez, Yamal sai da Euro consagrado como o melhor jogador jovem do torneio e o mais novo a marcar na história da competição.
Impondo o segundo vice consecutivo para os ingleses, a Espanha venceu todos os seus sete jogos, feito inédito na Euro, tal qual o tetracampeonato. O time comandado por Luís de la Fuente foi superior pela posse de bola, a dinâmica do meio-campo e, acima de tudo, pelo arsenal de dribles e velocidade incorporado com os melhores pontas do continente.
Num país que ainda resiste em punir racistas, o futebol serve para recarregar esperanças por um mundo mais inclusivo. Lamine Yamal e Nico Williams não são apenas filhos de imigrantes. De agora em diante, eles serão lembrados como espanhóis campeões europeus. E como exemplos de que a única via para derrotar o racismo é a integração.