ESPORTES
Mestre ensina capoeira de graça e muda a vida de deficientes
A capoeira é uma arte marcial de origem brasileira que integra golpes com pés, pernas, braços, mãos e cabeça à musicalidade ressoada pela boca. Ao longo do tempo, a imagem construída em torno desta cultura foi a de dois indivíduos saltando e fazendo piruetas em pleno ar, mas não para mestre Sidnei Sousa, 42, o mestre Ney, que há 10 anos aplica a capoeira adaptada para pessoas com necessidades especiais com um método totalmente inclusivo.
O capoeirista entendeu que a luta poderia auxiliar uma parcela importante da nossa sociedade se os golpes fossem adaptados. No Brasil, há cerca de 17 milhões de pessoas convivendo com alguma deficiência – física, visual, auditiva ou intelectual –, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A história de mestre Ney com os alunos da capoeira adaptada começou depois que o lutador mudou da zona leste da capital para Carapicuíba, município da região metropolitana de São Paulo, e passou a ensinar a arte marcial para alunos do Centro de Atendimento Especializado Léa Rosemberg. Segundo Ney, dar aulas para pessoas com deficiência física foi um desafio enorme, uma vez que nunca havia trabalhado com este público.
“Na época, uma pergunta que me fiz foi como adaptar a capoeira para pessoas com necessidades especiais. Eu nunca havia feito nada parecido ou conhecia alguém que fazia, mas entendi que era uma missão de Deus para mim eu tinha que cumprir da melhor maneira possível”, lembrou o mestre.
Inclusão de corpo e alma
O que motivou Mestre Ney a continuar com o projeto de inclusão, e fazer disso a razão da sua vida, foi a vontade de ajudar incondicionalmente aquelas pessoas. As deficiências têm diferentes níveis e, também por isso, existem diversas formas de ensinar uma metodologia nova. Foi com esse raciocínio que o capoeirista passou a fazer cursos de especialização para conseguir adaptar os golpes de capoeira aos novos alunos.
Rapidamente o projeto prosperou e crianças, adolescentes e idosos estavam gingando e jogando capoeira na roda com mestre Ney. Segundo o capoeirista, a luta auxilia os alunos no desenvolvimento de aspectos como a fala, coordenação motora, equilíbrio, lateralidade, interação social, além de trabalhar também o ritmo por meio da musicalidade.
“Na capoeira adaptada eu entendi que não dá pra exigir que uma pessoa cadeirante levante a perna ou faça movimentos que dependem de flexibilidade dos membros inferiores, mas dá pra adaptar os golpes que normalmente fazemos com as pernas, para serem executados pelas mãos destes alunos”, reforçou.
Capoeira é responsabilidade
Atualmente, mestre Ney atende, voluntariamente, mais de 200 alunos com idade entre 8 e 50 anos com Transtorno do Espectro Autista (TEA), Síndrome de Down, microcefalia e outras deficiências do Centro de Atendimento Especializado Léa Rosemberg, Associação Projeto Oficina (APO), ambos em Carapicuíba, e Projeto Criança Feliz em Jaguaré. Além disso, o capoeirista trabalha há 17 anos como segurança em uma empresa privada de onde garante o sustento da família.
Para Maria Zioneide Barbosa, 49, mãe da aluna Sabrina Barbosa, 24, a capoeira foi um divisor de águas na vida das duas. Isso porque, além da luta auxiliar a jovem que tem hidrocefalia e paralisia cerebral, o esporte é também um motivo que faz a acompanhante sair de casa e se distrair um pouco.
“A capoeira traz um senso de responsabilidade muito grande na vida da Sabrina, porque faz ela manter uma rotina semanal de treinos. Além disso, eu também acabo saindo um pouco de casa já que nós, mães e acompanhantes de pessoas com necessidades especiais, estamos 24 horas por dia voltados para os cuidados deles”, disse Maria Zioneide.
Projeto Inclusão Futebol Clube de Carapicuíba
Pensando em expandir a socialização das pessoas com necessidades especiais, Mestre Ney projetou o Inclusão Futebol Clube de Carapicuíba, um torneio de futebol para os alunos da capoeira adaptada com direito a participação de cadeirantes de outras regiões da cidade.
Desde 2018, uma vez por ano, o capoeirista faz do jogo de futebol mais uma ferramenta de inclusão social para meninos, meninas, jovens e idosos que aprenderam a sorrir com o rolar da bola, com o gingado da capoeira e o som do pandeiro e, principalmente, com o cuidado e afeto de um ser humano conhecido como mestre Ney.