ESPORTES
O dia em que Pelé resolveu reconhecer a paternidade da filha Sandra só na Justiça
Pelé sofreu um linchamento virtual nos últimos 16 anos. Bastava alguma notícia sobre ele, ou mesmo uma imagem, uma foto que fosse, ser publicada nas redes sociais, para que uma enxurrada de críticas surgisse.
Até 2006, as únicas contestações feitas ao cidadão Edson Arantes do Nascimento eram em relação ao seu pouco envolvimento em causas sociais.
E políticas.
Era criticado por não se posicionar publicamente contra o racismo. Exigia-se do Atleta do Século que ele lutasse contra a discriminação racial.
Que seguisse o exemplo de Muhammad Ali, que se recusou a lutar na Guerra do Vietnã. “os vietcongues são considerados negros asiáticos, e eu não tenho nenhum litígio contra pessoas negras”, disse Ali à época.
Pelé também era criticado por não se posicionar contra a Ditadura Militar, instaurada no Brasil em 1964, e que só terminou em 1985.
Mas a partir de 17 de outubro de 2006, o cidadão Edson Arantes do Nascimento virou alvo de duras críticas nas redes sociais.
Nesta data, Sandra Regina Machado Arantes do Nascimento faleceu em Santos, vítima de câncer na mama.
Sandra era filha da empregada doméstica Anísia Machado, falecida em 2014, com quem Pelé teve um relacionamento amoroso, em 1963, nos tempos em que era jogador, aos 23 anos.
Sandra começou a lutar para ser reconhecida por Pelé em 1992, quando tinha 27 anos.
ADEUS AO REI DO FUTEBOL:
A batalha judicial começou em 1996. Mesmo depois de o exame de DNA dar positivo, provando que Sandra era mesmo filha dele, Pelé, por intermédio de seus advogados, resolveu recorrer da decisão da Justiça.
Sandra, que durante o processo de reconhecimento pelo pai famoso foi eleita duas vezes vereadora em Santos, pelo Partido Social Cristão (PSC), decidiu fazer da luta pelo reconhecimento paternal a sua bandeira como vereadora e conseguiu transformar em lei que o Serviço Único de Saúde (SUS), fosse obrigado a realizar exames de DNA em todas as mulheres que não tivessem condições financeiras para pagar.
Além de só reconhecer a paternidade na Justiça, ainda assim depois de recorrer várias vezes, Pelé não compareceu ao velório de Sandra.
Limitou-se a enviar flores, que foram recusadas pela mãe de Sandra, Anísia Machado.
Em Santos, as opiniões sobre a questão divergem. Pelé sofre muitas críticas pela atitude.
Mas há também quem o defenda.
O lado de Pelé
O advogado e ex-Deputado Vicente Cascione é um defensor ferrenho de Pelé. Ele garante que foi chamado pelo Rei do futebol para uma reunião que seria realizada na casa da Lúcia, irmã de Pelé, na Ponta da Praia, em Santos, em agosto de 1992.
O encontro, quatro anos antes de Sandra Regina recorrer à Justiça para exigir o reconhecimento da paternidade, seria realizado com as presenças de Pelé, Lúcia, Davi, ex-jogador de futebol e casado com a Lúcia, e Sandra.
“Lembro-me bem. Era uma tarde de sábado. Eu não era advogado do Pelé. Vi o Pelé começar a sua carreira de futebol no Santos. Ele apenas me chamou para que eu ouvisse a conversa que eu teria com a Sandra. O Pelé ia reconhecer a paternidade, sem nenhum problema”, afirma Cascione.
O problema, segundo o relato de Vicente, foi provocado pelo advogado de Sandra à época.
“Este advogado, que inclusive já faleceu, chamou a imprensa para a reunião. Então, chegou e já começou a dar entrevistas na rua. A Sandra nem foi ao encontro. Quem apareceu foi o advogado. Seria o primeiro contrato que o Pelé iria ter com a Sandra. Mas quem apareceu foi o advogado. Foi criada uma situação terrível. O Pelé ficou muito irritado com a atitude do advogado e resolveu só assumir a paternidade na Justiça”, contou Vicente Cascione.
“Quando o Pelé viu que o advogado havia chamado a imprensa para a reunião, ele olhou para mim e disse: Fui traído. Agora só vou reconhecer a paternidade na Justiça”, lembra-se Vicente Cascione.
E foi exatamente o que aconteceu. O processo de reconhecimento na Justiça transformou-se em uma longa batalha.
Pelé, conta Vicente Cascione, ainda quis fazer o reconhecimento sem ter de ir para a Justiça. Aí quem não quis mais foi o seu advogado, Samir Jorge Abdul Hack, que posteriormente foi presidente do Santos, já falecido, disse que o melhor naquele momento seria ir até o final na Justiça.
Sandra tem dois filhos: Octávio e Gabriel Arantes do Nascimento que estiveram no Hospital Albert Einstein visitando o avô, já anestesiado e sem condições de abraça-los e também ser abraçado.
Octávio escreveu nas redes sociais.
“Errar e acertar fazem parte da nossa vida. Toda família tem brigas e rusgas, e a nossa não é diferente, mas há momentos em que o amor é mais importante do que qualquer coisa! Agradeço a Deus por ter proporcionado esse momento, pois era o que o que a minha mãe mais sonhava. Têm coisas que uns plantam e outros colhem, e nós estamos colhendo. Agradeço a quem ficou feliz por nós. Estamos extremamente felizes e, de antemão, agradeço a todos da minha família, que foram extremamente receptivas e amorosas com a gente. Estou torcendo e orando pela recuperação do nosso avô”, escreveu Octávio.