ESPORTES
Repercussão de história de pai de zagueira da Seleção causa mal-estar
A Copa do Mundo Feminina de 2023 é apontada por muitos como a maior edição de todos os tempos. O Brasil tenta seguir o desenvolvimento do futebol de mulheres no mundo. A CBF anunciou estrutura nunca antes oferecida para as atletas que disputam o torneio na Austrália e Nova Zelândia, com logística especialmente programada para a viagem em voo fretado, aclimatação adequada ao fuso horário da Oceania, trajes especiais e uma comissão técnica mais robusta.
Porém, as cobranças ainda são feitas à entidade que peca, por exemplo, em não reconhecer devidamente as pioneiras que pavimentaram o caminho da modalidade até aqui, a falta de igualdade no tratamento aos veículos independentes em relação às grandes mídias nas coberturas das competições e transmissões completas das competições.
Na última semana, repercutiu a notícia que o pai da zagueira Lauren vendeu seu automóvel e dorme em albergue para ver a filha de perto no Mundial. Após o caso vir a público, a reportagem do Terra tentou contato com o Erymar Alexandre, pai da defensora da Seleção para comentar o caso, mas ele foi orientado pela CBF a falar somente via assessoria. Procurada, a comunicação da entidade não autorizou a entrevista.
Erymar pediu apenas para uma correção ser feita, quanto a tudo que está veiculado na mídia. Segundo ele, Lauren custeou praticamente toda a viagem: “A história tomou uma proporção gigante, mas não está com o foco nas redes de que a venda da minha relíquia só contribuiu, e a Lauren foi quem teve quase a totalidade do custo.”
Assim como o pai da zagueira, muitas famílias de jogadoras não podem os ver jogos fora do País. Na grande maioria das vezes, parentes e amigos não conseguem viajar nem dentro do mesmo estado ou em outras regiões do Brasil para prestigiar as atletas.
Na mesma semana que a mídia repercutiu a história do pai de Lauren, um vídeo foi publicado pela CBF, na qual a entidade mostra uma casa na Austrália, que acomoda influenciadores digitais que foram levados ao país para a divulgação do Mundial.
Por mais que haja a parceria de patrocinadores que banquem a estadia dos influencers, muitos seguidores cobraram a Confederação por não dar o mesmo apoio para os familiares das atletas que gostariam de acompanhar a Seleção Brasileira na Copa.
Para o Mundial masculino do Catar, a CBF também decidiu não financiar as viagens e hospedagens dos familiares, apesar de a entidade já ter feito isso em outros torneios. Segundo a Confederação, a ideia era dar mais privacidade aos jogadores.
Apesar do avanço nos últimos anos, a realidade do futebol feminino ainda é muito diferente do masculino. Há disparidade de salários, estrutura e patrocínios entre as modalidades. A CBF igualou em 2020 as diárias e premiações entre homens e mulheres dentro da Seleção, mas a iniciativa tardia, ainda não reflete completamente na vida das atletas. Poucas conseguem ajudar nas despesas de suas famílias, menos ainda organizar viagens.
Lauren já uma realidade, mas ainda exceção. Começou a carreira na base do São Paulo em parceria com o Centro Olímpico, e passou as duas últimas temporadas no Madrid CFF da Espanha. Anunciada recentemente pelo Kansas City dos Estados Unidos, a zagueira de apenas 20 anos, faz parte de uma pequena parcela de jogadoras brasileiras que são profissionalizadas.
De acordo com um Relatório de Benchmarketing da FIFA de 2022, quase um quarto (23%) dos 225 clubes em 25 ligas nacionais têm principalmente jogadoras amadoras, enquanto o restante trabalha com uma parcela de profissionais. 53% das federações pesquisadas ainda não têm regulamentação sobre salário mínimo das jogadoras.
Dados recentes do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) apontaram que em todo o ano de 2022, foram contratados 557 atletas profissionais homens no Brasil, em comparação com apenas 174 atletas mulheres.
Os números mostram que muitas jogadoras estão longe de viverem do esporte. Elas contam com os esforços de suas famílias que pagam suas passagens para os treinos, alimentação, compra de materiais esportivos, entre tantas outras despesas.
As prioridades da CBF com a modalidade são outras, não é obrigação da entidade organizar viagens para as famílias, mas no caso do futebol feminino, que já recebe menor investimento, faltou bom senso ao pensar em uma Copa do outro lado do mundo.
Contar com patrocínios para realizar as viagens, seria uma opção produtiva para a imagem da instituição, mas principalmente valorizaria as atletas por toda dedicação, e contemplaria os seus maiores fãs, pelo apoio incondicional.
O Terra tentou contato com a CBF, mas não obteve retorno. A reportagem será atualizada em caso de posicionamento.