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Depressão cresce 41% com pandemia: ‘apoio é essencial para sair do fundo do poço’, conta humorista
O humorista Diego Cardoso, de 36 anos, viu “o fundo do poço” durante a pandemia, período em que recebeu o diagnóstico de depressão. Conflitos que ele já vivia e as incertezas em tempos de Covid-19 se juntaram a outros fatores que o levaram para a terapia e a medicação. O quadro de Cardoso reflete um cenário captado por uma pesquisa recente: os diagnósticos depressão cresceram 41% no Brasil entre o período pré-pandemia e o primeiro trimestre de 2022 (entenda mais sobre a pesquisa abaixo).
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“Todo mundo que diz ‘a pandemia me deixou mal’, na verdade, já não estava bem antes. Claro que o isolamento tem um poder absurdo na cabeça das pessoas, mas se o alicerce estiver bem-feito, pode cair qualquer peso em cima que não abala”, analisa Cardoso.
A visão de Cardoso sobre os diagnósticos combina com as análises de especialistas no tema: a depressão é uma doença multifatorial, que em parte é geneticamente determinada, mas que também é influenciada por outras questões “ambientais”. (Leia mais em: Depressão: tem cura? Onde buscar ajuda? Veja 8 dúvidas sobre a doença que afeta 11% dos brasileiros)
Pesquisa Covitel
O levantamento que capturou o aumento de 41% nos casos de depressão no país foi realizado em conjunto pela Vital Strategies e pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Divulgada em abril, ela foi batizada de Covitel (Inquérito Telefônico de Fatores de Risco para Doenças Crônicas não Transmissíveis em Tempos de Pandemia) e sua metodologia baseada em ligações telefônicas para 9 mil pessoas.
A intenção foi retratar a magnitude do impacto dos principais fatores de risco para doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) na população adulta. Por isso, entre outros pontos, a pesquisa também apontou o crescimento do uso de cigarros eletrônicos e o aumento do sedentarismo, e mostrou que os jovens e os adultos até a faixa dos 40 anos estiveram entre os mais afetados pelo aumento nos diagnósticos de depressão.
Crise financeira e apoio
Como ocorreu com muitos brasileiros, o impacto no bolso foi um dos grandes dilemas do período de pandemia para Cardoso. “Acho que a privação financeira foi o ponto principal, porque disso vem todo o resto. A dificuldade de levantar o dinheiro me trouxe coisas negativas”, desabafa o comediante que teve sua agenda de shows totalmente cancelada em 2020.
Morando sozinho e buscando alternativas para trabalhar, ele passou a dividir seu conteúdo humorístico na internet. “Mudou tudo, eu saí completamente do trabalho físico e fui para o trabalho online e todo mundo fez a mesma coisa, criou um canal e começou a fazer live”, conta. A comédia continuou sendo seu alicerce, contradição que ele julga ter sido um caminho óbvio de se trilhar, mesmo quando a desesperança bateu.
“Em meio ao caos, é mais fácil tomar a decisão de querer ser engraçado, você tinha vários profissionais de tudo que é área fazendo coisas que julgavam engraçadas e assim entraram no cardápio de comédia, além dos profissionais veio uma galera absurda fazendo isso”, relembra.
O aumento repentino de produtores de conteúdo adicionou uma pressão extra na rotina de Cardoso, uma vez que muitos nomes novos surgiram e o público aderiu aos novos rostos que se destacavam. O comediante observa que foi nesse momento em que o on-line, que antes era só uma alternativa, se tornou “um funil onde o mais alternativo não passa”.
Enfrentando todas essas dificuldades em segredo, ele se isolou ainda mais do que o imposto, se afastando até mesmo do contato virtual que tinha com os amigos. Sua experiência o fez reconhecer que não há a possibilidade de sair da depressão sozinho, seja antes ou depois do diagnóstico.
“Não fui nem eu que fui atrás do terapeuta, foi um amigo que trouxe até mim. Eu não conseguiria sair sem o acolhimento de pessoas e do uso de remédios. A depressão não é só a tristeza. Não é estar feliz ou triste, é simplesmente não estar. Um vazio”, explica Cardoso.
Em entrevista ao g1, Humberto Corrêa, professor titular da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), afirmou que há uma mensagem que deve ficar clara para a sociedade quando o tema é depressão: a importância do apoio.
“A depressão é uma doença. O paciente não tem controle sobre isso, ele precisa de ajuda. Muitas vezes, durante o processo depressivo, a pessoa não tem nem ânimo, nem energia dela própria procurar ajuda – ela vai precisar que alguém pegue na mão dela e leve até essa ajuda, até o profissional de saúde, até o centro de saúde”, alerta Humberto Corrêa, professor de medicina.
Rede de apoio
Paciente e estudiosa do tema, a psicanalista Luisa Lancelotti tem 27 anos e convive com o diagnóstico de depressão há sete anos. Ela encara uma outra faceta da depressão: a forma severa e crônica da doença. Apesar de a condição sempre ter feito parte da sua realidade, já que acomete outros de seus familiares, para ela não foi simples encontrar apoio em meio ao seu círculo social.
“A rede de apoio é muito precária. Não acho que seja intencional, mas é uma falta de sensibilidade e de informação. Não tive uma rede muito substancial. Tive pais desesperados e muito apavorados, sem saber como ajudar e o que fazer. Nessas, mais atrapalhava do que ajudava porque vinham coisas muito simplistas, como ‘levanta da cama vai fazer o que você gosta’, mas as pessoas não entendem que não tem algo que você goste durante uma crise “, relata.
Nesse quesito, o comediante Diego Cardoso é enfático ao dizer que viveu o posto. Quando as pessoas mais próximas a ele descobriram o que ele estava passando, os laços se estreitaram.
“Se eu estou aqui falando hoje é porque eu dividi com os outros. Está com um problema? Procura alguém, seja quem for. Você precisa externar a situação dando a devida proporção quando você for falar”, aconselha o humorista.
Espaço de acolhimento
No entanto, há uma diferença entre buscar o apoio e conseguir obter um espaço de acolhimento. Luisa conta que se ressente por ter vivido muitos momentos dessa jornada de maneira muito solitária, mas que o tempo a ajudou a entender que não é tão simples assim oferecer ajuda nesse contexto.
“É muito difícil conseguir dar conta da carga emocional de estar ao lado de uma pessoa vivendo essa parada”, reflete Luisa.
E é nesse momento que o estigma age. Encarando a questão sozinha, a psicanalista se sentia culpada e ingrata. “Acho que a depressão tem muito essa marca de serem pessoas tristes, mas sem razão de estarem tristes. Fui desconstruindo isso comigo mesma por entender que essa é a minha realidade e eu preciso organizar e dar sentido para isso dentro de mim”, pontua ela.
Essa percepção ajuda a estabelecer expectativas adequadas quanto ao tratamento e aos avanços. Nem sempre o próximo passo após obter um diagnóstico e medicação é a pessoa voltar a ser o que era, com a depressão desaparecendo sem deixar vestígios. Cada caso é um caso.
“As pessoas simplesmente precisam aceitar que essa é uma condição do momento. (Se eu pudesse) eu desfaria a ideia de que as pessoas (com depressão) têm um defeito, como se tivesse falhado em alguma coisa”, finaliza a psicanalista.
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(*Com colaboração de Lara Pinheiro)