GERAL
Estudo alerta para disputas e conflitos ameaçando as fronteiras da Amazônia

Um novo relatório, intitulado “Amazônia em Disputa”, lança luz sobre as complexas dinâmicas de conflitos e vulnerabilidades que assolam as áreas de fronteira da Amazônia, um bioma de importância estratégica global para a regulação climática, biodiversidade e culturas tradicionais. O estudo, resultado de uma parceria entre o Instituto Igarapé, a União Europeia e a Fundação para a Conservação e o Desenvolvimento Sustentável (FCDS), foi divulgado esta semana em Bogotá, Colômbia.
Com foco na região noroeste da Amazônia, onde se encontram as fronteiras de Brasil, Colômbia, Venezuela, Equador e Peru, o relatório mapeia os principais atores, áreas críticas e os diferentes tipos de disputas que colocam a região em risco:
-Disputas Ambientais: Danos à floresta causados por degradação, desmatamento, queimadas e exploração predatória.
-Disputas Criminais: Atuação de grupos armados e redes ilícitas que operam entre a legalidade e a ilegalidade, envolvendo narcotráfico, mineração ilegal e cobrança de impostos locais.
-Disputas de Capital: Processo de transformação da floresta em mercadoria por meio de cadeias legais e ilegais de extração de drogas, ouro, madeira e gado, alimentando o desmatamento e a lavagem de ativos.
-Disputas Institucionais: Fragilidade e fragmentação da governança na região, permitindo a expansão de redes criminosas enquanto a presença do Estado se mostra desarticulada e ineficaz.
Melina Risso, diretora de pesquisa do Instituto Igarapé, destaca que as economias ilícitas que pressionam a Amazônia estão conectadas a mercados globais, tornando a responsabilidade compartilhada entre os países amazônicos e aqueles que consomem os ativos extraídos da região. Ela enfatiza a necessidade de respostas conjuntas para enfrentar os danos concretos observados no território.
Principais desafios:
-Presença de Grupos Armados: Atuação de pelo menos 16 grandes grupos armados ilegais em 69% dos municípios amazônicos, incluindo Comando Vermelho (CV), Primeiro Comando da Capital (PCC), Exército de Libertação Nacional (ELN) e dissidências das FARC.
-Altas Taxas de Homicídio: Índices de violência superiores às médias nacionais em quase todos os países, com destaque para as fronteiras de Putumayo (Colômbia), Madre de Dios (Peru) e Sucumbíos (Equador), onde convergem narcotráfico, mineração ilegal e ausência do Estado.
-Fluxos Financeiros Transnacionais: Operação de grupos criminosos em redes de economias ilícitas que incluem cadeias de ouro, madeira e drogas articuladas com mercados formais.
-Impacto sobre Populações Indígenas e Ribeirinhas: Deslocamentos forçados, perda de territórios e destruição dos meios tradicionais de vida, tornando essas populações as mais atingidas pela violência e atividades ilegais.
-Ameaças a Defensores Ambientais: Região mais perigosa do mundo para defensores ambientais, com mais da metade dos assassinatos globais de 2023 ocorrendo na Amazônia, devido à atuação frágil e equivocada do Estado.
Disputas fronteiriças:
O estudo identifica cinco áreas de fronteiras na Amazônia com dinâmicas particulares de disputas, incluindo territórios no Brasil:
1. Guainía–Orinoco (Colômbia–Venezuela): Fluxo intenso de bens legais e ilegais, garimpo e redes criminosas, com pressão sobre comunidades indígenas e degradação ambiental.
2. Mitú–Taraira (Colômbia–Brasil): Baixa presença estatal, rotas de narcotráfico e mineração ilegal, com atuação de grupos armados e pressão sobre comunidades tradicionais.
3. Trapézio Amazônico (Colômbia–Brasil–Peru): Epicentro da economia ilícita, com rotas estratégicas de tráfico de drogas e armas, intensa atividade fluvial e conexões internacionais de grupos armados.
4. Putumayo (Colômbia–Equador–Peru): Zona crítica do narcotráfico e da violência letal, com sobreposição de grupos armados, rotas ilícitas, pressão sobre a floresta e deslocamentos forçados.
5. Yavarí (Brasil–Peru): Difícil acesso, expansão de garimpo ilegal, extração de madeira e tráfico de mercadorias, com ausência do Estado, disputas por territórios indígenas e forte degradação ambiental.
Diante desse cenário, Melina Risso defende a necessidade de estabelecer novas estruturas de governo para a Amazônia, com articulação interinstitucional dentro de cada país e entre os países. A 5ª Cúpula de Presidentes dos Estados Partes do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) é apontada como uma oportunidade para definir esses novos rumos, com foco na cooperação em segurança pública, alternativas econômicas e pagamento por serviços ecossistêmicos.
O estudo busca chamar a atenção para a urgência de uma ação coordenada, alertando que não há mais tempo para esperar que todas as relações diplomáticas estejam estabelecidas para avançar na proteção da Amazônia.