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GERAL

Vítima da covid-19, morre o visionário dirigente esportivo Sebastião Alencar

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Sebastião de Melo Alencar, de 84 anos, não resistiu as sequelas da covid-19 e veio a óbito. Foto/Manoel Façanha

O futebol acreano perdeu na noite dessa quinta-feira (17) um de seus maiores dirigentes da história. Internado há vários dias no Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia do Acre (Into-AC) para tratar da covid-19, o empresário e presidente Conselho Deliberativo do Rio Branco, Sebastião de Melo Alencar, de 84 anos, não resistiu as sequelas da doença e veio a óbito.

De acordo com os médicos, o empresário estava com a saturação bastante alta e sofreu uma parada cardíaca, não resistindo e vindo a óbito. O enterro do dirigente vai ocorrer nesta sexta-feira, em Rio Branco-AC.

Natural de Belém, o empresário Sebastião Melo de Alencar nasceu em 21 de janeiro de 1938. A chagada ao Acre ocorreria dia 22 de janeiro de 1967, para exercer o cargo de gerente de uma empresa do ramo de transportes aéreos.

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Confira a seguir uma entrevista especial concedida pelo empresário no mês de novembro de 2002, véspera de deixar à presidência do Rio Branco.

 Sebastião Alencar – o adeus de uma cartola

MANOEL FAÇANHA

Com a consciência de missão cumprida à frente do Rio Branco FC, depois de sete mandatos, o empresário paranaense Sebastião de Melo, 64 anos, a partir de janeiro de 2003 entrega a direção do Estrelão para nunca mais voltar à cadeira de presidente.

No dia 5 de novembro de 2002, Sebastião de Melo Alencar aceitou o convite para falar à reportagem de O Rio Branco de sua trajetória no futebol do Acre. Sentado em uma cadeira da redação do jornal, Alencar viajou no tempo por mais de duas horas, falando das saudades, sonhos e fatos pitorescos de sua vida futebolística. Por várias vezes deu risadas, lembrando ainda de seu amor pelo Clube do Remo e de sua paixão desenfreada pelo Rio Branco. Mas nada tocou tanto o coração desse cartola, de origem de classe média, como falar do amigo e confidente Zé Leite, ex-editor de O Rio Branco, falecido em 1998. Mesmo engasgado, Alencar comentou da amizade e do carinho que Zé Leite tinha com o Rio Branco FC. Veja na sequência a matéria na íntegra.

ALENCAR JÁ FOI ATACANTE

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No final da década de 1950, o então franzino e jovial Sebastião de Melo Alencar arriscava uma de ponta de lança no Náutico de Canudos, time suburbano da capital Belém (PA). Por ironia do destino, as cores do Náutico eram vermelha e branca, as mesmas do clube que duas décadas depois Alencar estaria presidindo no Acre.

MISSÃO CUMPRIDA

Aos 64 anos, 35 deles vividos no Acre. Sebastião de Melo Alencar confirmou durante a entrevista sua decisão de abandonar o futebol. “Não estou mais disposto a militar no desporto. Mas, quero deixar claro que, minha consciência está tranquila em relação à vasta contribuição que dei para futebol do Rio Branco FC”.

O INÍCIO DA TRAJETÓRIA DE UM PRESIDENTE VENCEDOR

Em janeiro de 1967, chegava em Rio Branco por motivo de trabalho, para gerenciar a empresa Paranaense Transportes Aéreos, Sebastião de Melo Alencar, um torcedor remista de carteirinha, frequentador assíduo do Baenão desde tempos de criança.

Longe do time de coração, Sebastião de Melo Alencar resolveu matar a saudade comprando um rádio Transglobo para ouvir as transmissões dos jogos do Remo, mas nada comparado à emoção das centenas de jogos observados a olho nu.

FUI GALO, MAIS POR POUCO TEMPO

Ainda em 1967, Alencar, mesmo timidamente, resolve assistir a um jogo de futebol no Stadium José de Melo, saindo frustrado do campo, uma vez que a partida acabara em pancadaria com socos e pontapés sobrando para a arbitragem.

Com sangue azul correndo as veias, não seria nada espantoso à época se Alencar escolhesse o Atlético Acreano como clube preferido na terra do Imperador Galvez, algo concretizado, mas sem grandes paixões e afinidades. Porém, o destino que Deus traçou para esse paranaense, aqui no Acre, seria totalmente contrário à cor azul do seu querido Clube Remo.

INÍCIO DA PAIXÃO PELO ESTRELÃO

Na década de 1980 – trio de presidentes posa para fotografia: Wilson Barbosa, Sebastião Alencar e Edmir Gadelha. Foto/Revista do Estrelão

Em 1974, Sebastião de Melo Alencar consegue por intermédio da família trazer o Clube do Remo para três jogos amistosos no Acre: Atlético (1 a 1), Rio Branco FC (1 x 2) e A. C. Juventus (1 x 3). A proeza de Alencar foi lucrativa para os cofres do Rio Branco como também para sua imagem de, agora, cartola. Surgindo daí uma aproximação com o clube estrelado até o convite para ser candidato a vice-presidente na chapa de João Carlos, em 1975.

Com a eleição vitoriosa, João Carlos e Alencar trataram de fazer um time competitivo para abocanharem o título estadual de 1975. Porém, ainda no primeiro ano de administração, João Carlos resolveu largar a direção do “Mais Querido”, após os incidentes da decisão do returno do estadual, quando o clube estrelado perdeu o título para o A.C. Juventus, por abandonar o gramado, uma vez que o clube discordava de uma penalidade assinalada em favor do adversário, pelo árbitro José Ribamar, quando o placar registrava um empate (1 a 1). O caso foi parar no TJD da antiga CBD, com o Rio Branco FC perdendo o jogo e seu presidente suspenso por 180 dias.

O troco veio um ano depois, em 1976, quando Rio Branco FC venceu de virada o A.C. Juventus na decisão do I Copão da Amazônia, gols de Mário Vieira e Eli, aos 37 e 44 do segundo tempo, respectivamente.

Para Alencar, nada é comparado à emoção daquele 24 de outubro de 1976.

“Virei a noite, comemorei como criança, quase apanhei da mulher quando cheguei em casa, não era minha praxe virar a noite a fora”, enfatiza com emoção e saudosismo o cartola estrelado.

VOLTA DE ALENCAR À PRESIDÊNCIA

No ano de 1979, o paranaense Sebastião de Melo Alencar, bem mais maduro, retornou à direção do Rio Branco FC para dois mandatos consecutivos: 79/80 e 81/82.

Neste primeiro ano de segundo mandato, Alencar declara com tristeza a forma antidesportiva que os dirigentes do A.C Juventus usaram para distorcer os fatos a respeito da irregularidade do clube juventino no Copão da Amazônia de 1979 – seis jogadores sem condição de jogo, acusando a diretoria do coirmãos (Rio Branco) das denúncias aos organizadores do torneio. O cartola estrelado também reclamou que, a imprensa, à época, a mando dos juventinos, estes no poder político do Estado, “manchetaram” acusações contra a diretoria estrelada, algo que o deixou bastante angustiado, a ponto do fato de ficar mais registrado em sua memória que a própria conquista do bicampeonato do Copão da Amazônia, em cima do Ferroviário (1 a 0), gol de Bruno, em 1979, no estádio Aluízio Bezerra, em Porto Velho, Rondônia.

Rio Branco – 1979. Em pé, da esquerda para a direita: Tião, Cleiber, Vilson, Zezito, Seu Chiquinho (torcedor), Chicão e Sebastião Alencar (presidente). Agachados: Paulo Roberto, Ely, Mário Vieira, Adalberto, Irineu e Nino. Foto/Acervo Chicão Araújo.

ALENCAR: NA ERA DO PROFISSIONALISMO

Sebastião de Melo Alencar conversa com jogadores e comissão técnica no início dos anos 1990. Foto/Acervo Pessoal Manoel Façanha

Depois de sete anos afastados da direção do clube do Estrelão, Sebastião Alencar, após deixar a gerência da Vasp para presidir a empresa de água mineral Verágua, estava mais à vontade para comandar o clube estrelado.

A primeira missão à frente do Clube era garantir o passaporte para a Segunda Divisão do Futebol Brasileiro, algo concretizado após uma ótima performance na Terceira Divisão/89: em 14 jogos, 7 vitórias, 3 empates, 4 derrotas, 14 gols pró e 14 gols contra (11ª posição).

No final da década de 1980, o presidente Sebastião de Melo Alencar repatriou o meia Mariceudo para o Estrelão. Acervo/Manoel Façanha

No ano seguinte, em 1990, o Rio Branco FC entra para a disputa da segunda divisão. Na tabela, o clube pega adversários fortes, entre eles, o Guarani, que à época contava com o futebol do genial Pita.

Mas, em 1991, o ano foi ruim para o time do presidente Alencar. Além da perda do estadual, o time foi um desastre na disputa da segundona nacional, venceu apenas um jogo, empatou seis e perdeu sete partidas e ainda invencibilidade de dois anos em torneios nacional. Porém, em 1992, antes de entregar a presidência, Alencar ainda levou o Rio Branco FC ao título estadual.

O MAIOR TRIUNFO

Rio Branco FC – campeão da I Copa Norte de 1997. O então presidente Sebastião de Melo Alencar é o segundo, da esquerda para a direita. Foto/Acervo Pessoal Manoel Façanha.

O ano de 1997, além de registrar uma das grandes alagações da capital do Acre, também ficará na história do futebol acreano. Naquele ano, o time estrelado conquistou o título da primeira edição da Copa Norte, fora de casa, diante do Clube Remo, time de “coração” do presidente estrelado: 2 a 1, gols de Venícius e Palmiro, credenciando o primeiro clube do Norte do país para representar o Brasil em uma competição internacional (Conmebol). “Foi uma conquista histórica para o futebol do Acre, uma proeza que o outro clube acreano terá dificuldade para alcançar”, diz orgulhoso o cartola.

Mas, se o título da Copa Norte abriu espaço para o Rio Branco no cenário nacional, a Copa do Brasil só veio a confirmar a boa fase do Rio Branco, desclassificado apenas pelo Flamengo de Romário & Sávio, após vitória em casa por 2 a 1 e derrota no Maracanã por 5 a 1. Antes, o time acreano passou pelo forte Goiás, em pleno Serra Dourada. Com essa proeza, o Rio Branco FC garantiu o 10° lugar no ranking da Copa do Brasil e 44 ª posição no ranking dos clubes do país (Revista Placar).

“FIZ ALGUMAS BURRADAS”

Não é só de acertos, mas, também de erros a vida de um cartola de futebol. Om o mandato por entregar, Alencar, bem relaxado, confidencia que, por várias vezes, pisou no tomate. Uma delas, quando da contratação do volante Rocha, oriundo do futebol de Goiás, em 2000, reforço para a disputa da Copa Norte e Brasil. “Ele, o Rocha, tinha o estilo do Vampeta jogava. Não tive dúvida: contratei. Mas, aqui o Acre, nossa! Foi uma decepção”, lembrou sorridente Alencar.

Questionado sobre quais as melhores contratações que o Rio Branco fez durante os 27 anos que conviveu dentro e fora do clube, Alencar nem pensou muito: “Mário Vieira, Gil e Tadeu, os dois primeiros de minha responsabilidade”.

O cartola também falou com orgulho da tradição do clube em pagar salários em dia, atitude que atravessa as divisas do estado, facilitando as negociações de novas contratações. Outro fator de orgulho, segundo Alencar, é a tradição do Rio Branco FC. ”O Rio Branco não entra meramente como coadjuvante em torneios que disputa. Entra para brigar pela cabeça”, diz cartola.

MELHOR TIME

Para Alencar, o melhor time dirigido em sua gestão foi aquele de 1989, quando a equipe conseguiu alcançar a 11ª posição na seletiva para a segunda divisão do futebol nacional, competição que reuniu 92 clubes de todo o país. Porém, o dirigente cita ainda o time estrelado de 1990, mas não esquecendo a equipe que conquistou a Copa Norte de 1997. O time estrelado de 1989 era formado pelos seguintes jogadores: Klowsbey, Alexandre, Chicão, Ronaldo Pará e Carlinhos; Merica, Mariceudo, Jair Feitosa e Venícius; Manelão e Artur.

 

Rio Branco – 1992. Em pé, da esquerda para a direita: Joraí (preparador físico), Klowsbey, Carlos, Evandro, Merica, Jorge Cubu, Chicão, Paulo Roberto (técnico) e Sebastião Alencar (presidente). Agachados: Cláudio, Ulisses, Siqueira, Paulo Henrique e Jamerson. Foto/Acervo Francisco Dandão.

 

Rio Branco – 1984. Em pé, da esquerda para a direita: David Abugoche, Sebastião Alencar, Cirênio, Auzemir, Casquinha, Paulo, Pedrinho e José Macedo. Agachados: Toinho, Stênio, Jorge Tijolo, Marinho e Dezinho. Foto/Acervo Francisco Dandão.

 

CLUBE SEM DÍVIDA

O presidente estrelado, que por sinal é um dos responsáveis pela construção das galerias de loja do Rio Branco FC, como também pela informatização da sede administrativa do clube, larga a direção sem deixar dívidas para o sucessor.

AMIZADES

No início dos anos 2000, Sebastião de Melo Alencar e o presidente Antônio Aquino Lopes (Ffac). Foto/Manoel Façanha

Fiz grandes amizades no futebol de Norte a Sul do país. No Acre, por exemplo, posso citar o saudoso jornalista Zé Leite, torcedor apaixonado do Rio Branco, um homem íntegro que também contribuiu e muito para o futebol do Rio Branco. Após sua morte, por inúmeras vezes sonhei com o Zé’’, disse com saudosismo Alencar. Outra pessoa a qual cartola se refere com estima é o presidente da Federação Acreana de Futebol, Aquino Lopes, chamado carinhosamente por Alencar de Baixinho. Um dirigente competente em sua avaliação que, até hoje, reúne-se em um restaurante da cidade para falar de futebol política e econômica…

Quanto à imprensa e demais dirigentes, o cartola afirma que não leva mágoa de ninguém, respeita a todos, uma vez que todos tinham e têm o mesmo ideal: caminhamos juntos para o bem do futebol do Acre.

Questionado sobre o adjetivo de presidente paizão, Alencar respondeu com a seguinte frase: “Não gosto de ver ninguém chorando miséria, principalmente aquelas que dependem de mim”

CASAMENTO E FORMATURA

Depois d quase três anos longe da noiva, a saudade falou mais alto e, em 1969, Sebastião de Melo Alencar casa-se com a paraense Maria de Fátima, a qual lhe deu três filhos (duas mulheres e um homem). Mesmo não sendo simpática à vida de cartola que o marido levava, Dona Maria Fátima foi exemplo de mulher fiel e jamais criou dificuldade para afogar os sonhos do esposo na vida futebolística, algo que contribuiu e muito para o fortalecimento da união do casal.

Outro objetivo alcançado pelo cartola ocorreu seis anos após o casamento. A conclusão do curso em bacharel em direito pela Universidade Federal do Acre (Ufac), janeiro de 1975.

BOA SORTE PARA QUEM FICA

Na temporada de 2008, o Rio Branco lançava seu novo uniforme para o Campeonato Brasileiro da Série C e reuniu numa imagem quatro presidentes: Bruno Cota Paiva, Lourival Marques, Sebastião de Melo Alencar e Natal Xavier. Foto/Manoel Façanha

Com a consciência tranquila da contribuição que deu ao futebol do Acre, Alencar deseja aos dirigentes que ficam boa sorte.

Em sua avaliação da atual conjuntura do nosso futebol, Alencar enfatiza que: “quando o nosso futebol tinha motivação faltava estrutura, em breve, deveremos contar com dois estádios: Federação de Futebol do Acre (FFAC) e outro estadual”.

COMENTÁRIOS

Nos primeiros anos de 2000, o presidente Sebastião de Melo Alencar e o diretor de futebol Natal Xavier recebem a senadora Marina Silva. Foto/Manoel Façanha

“As autoridades do Acre sempre caminharam de costas para nosso futebol. Mas, para não sermos injustos, aproveito o espaço para parabenizar o incentivo do governador Jorge Viana ao futebol no Acre, uma vez que sem a pareceria clubes, federações e Governo do Estado dificilmente haveria a disputa do Campeonato Acreano”, frisa Alencar, comentando ainda que a atual legislação do futebol brasileiro (lei Pelé) poderá ser responsável pela falência e desaparecimento de clubes por toda parte do país.

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