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Alinhado a Trump, Texas processa fabricantes do Tylenol alegando que eles esconderam riscos de autismo

O procurador-geral do Texas, Ken Paxton, processou os fabricantes do Tylenol, acusando as empresas de ocultarem os riscos do medicamento para o desenvolvimento cerebral infantil. A ação representa a mais recente repercussão de uma declaração do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que no mês passado associou o uso do Tylenol na gravidez ao autismo — uma ligação que não possui comprovação científica. As informações são do jornal americano The New York Times.
O processo tem como alvo a Johnson & Johnson, que comercializou o produto por décadas, e a Kenvue, empresa derivada que vende o medicamento desde 2023.
A ação alega que as companhias omitiram intencionalmente dos consumidores evidências sobre uma possível relação entre o Tylenol e o surgimento de autismo e transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). O texto também sustenta que a criação da Kenvue teria como objetivo proteger a Johnson & Johnson de processos judiciais relacionados ao medicamento.
Este é o primeiro processo movido por um estado americano que se baseia nas alegações de Trump sobre o acetaminofeno (princípio ativo do Tylenol). A tese de que o consumo durante a gravidez poderia causar distúrbios neurodesenvolvimentais, embora antiga em círculos de seguidores de Robert F. Kennedy Jr., ganhou notoriedade após as declarações do presidente.
Fabricantes defendem segurança do remédio
A Kenvue defende repetidamente a segurança do Tylenol e rejeita as alegações que associam o uso do medicamento durante a gravidez ao autismo.
“Vamos defender-nos contra estas alegações infundadas e responderemos de acordo com o processo legal”, afirmou Melissa Witt, porta-voz da Kenvue. “Apoiamo-nos firmemente na comunidade médica global, que reconhece a segurança do paracetamol, e acreditamos que continuaremos a ser bem-sucedidos nas ações judiciais, pois estas alegações carecem de fundamento legal e respaldo científico.”
Em outros processos, a Johnson & Johnson declarou que sempre agiu com responsabilidade ao alertar os consumidores sobre o risco de dano hepático quando o Tylenol é consumido em excesso.
Clare Boyle, porta-voz da Johnson & Johnson, disse que a empresa “desfez-se do seu negócio de produtos de consumo há anos, e todos os direitos e passivos associados à venda dos seus produtos de venda livre, incluindo o Tylenol (paracetamol), são de propriedade da Kenvue”.
Centenas de ações judiciais foram movidas nos últimos anos por famílias que alegam que seus filhos foram diagnosticados com autismo ou TDAH após o uso de Tylenol durante a gravidez.
No maior grupo de casos, julgado em um tribunal federal, um juiz de Nova York rejeitou as ações por falta de evidências científicas confiáveis. Os autores recorrem da decisão, com uma audiência marcada para 17 de novembro.
Estudos científicos e o processo movido pelo Texas
Durante anos, cientistas investigaram uma possível ligação entre o paracetamol e distúrbios do neurodesenvolvimento, mas os estudos realizados até o momento apresentam resultados inconclusivos.
Grupos médicos contestaram o alerta emitido pela administração Trump em setembro, ressaltando que o Tylenol é o único analgésico considerado seguro para uso durante a gravidez no tratamento de febres altas. A falta de tratamento, por sua vez, representa sérios riscos tanto para a saúde do bebê quanto da mãe.
A ação movida por Paxton adota uma abordagem distinta: alega que a Johnson & Johnson e a Kenvue violaram a lei do Texas ao deixarem de informar os consumidores sobre os possíveis riscos do uso do Tylenol durante a gestação.
Tribunais do Texas costumam ser desfavoráveis a autores em ações por danos pessoais. A decisão de Paxton de propor a ação em um condado rural e conservador, próximo à fronteira com a Louisiana, é vista como uma estratégia para assegurar um tribunal mais favorável à sua causa, segundo o New York Times.
O processo também sustenta que a Johnson & Johnson criou a empresa derivada deliberadamente, ao menos em parte, para se proteger de responsabilidades legais relacionadas ao Tylenol — embora a denúncia não apresente provas concretas para essa alegação.
A cisão foi anunciada pela Johnson & Johnson em 2021 e concluída em 2023, transferindo para a Kenvue o portfólio de marcas como Tylenol, Band-Aid e Johnson’s Baby Shampoo.
Na ocasião, a empresa justificou a decisão como parte de um plano de focar em setores mais lucrativos e dinâmicos, como farmacêutico e dispositivos médicos. Paralelamente, a Johnson & Johnson enfrentava uma série de ações judiciais onerosas relacionadas ao seu envolvimento na crise de opioides e a alegações de que o talco usado em seu pó infantil teria causado câncer em algumas consumidoras.
Analistas de Wall Street, no entanto, não associaram a cisão aos processos envolvendo o Tylenol, que ganharam volume apenas a partir de 2022.









