MUNDO
Com tarifaço de Trump, aliados querem redesenhar o mapa comercial mundial, mas sem os EUA

O caos comercial aproximou os aliados dos Estados Unidos e os afastou do país. E, à medida que isso acontece, a União Europeia (UE) tenta se posicionar no centro de um novo mapa comercial global.
O bloco de 27 nações soube neste fim de semana que os Estados Unidos pretendem impor tarifas de 30% a partir de 1º de agosto. Ursula von der Leyen, presidente do poder executivo da UE, respondeu com a promessa de continuar negociando e retaliar, se necessário.
Mas essa não é a estratégia completa. A Europa, como muitos dos parceiros comerciais dos Estados Unidos, também procura amigos mais confiáveis.
“Enquanto isso, continuamos a aprofundar nossas parcerias globais, firmemente ancoradas nos princípios do comércio internacional baseado em regras”, disse von der Leyen.
Ela cumpriu a promessa já neste domingo. Von der Leyen discursou ao lado do presidente da Indonésia. Enquanto Donald Trump ameaça impor tarifas pesadas ao país asiático, a União Europeia trabalha para relaxar as barreiras comerciais.
É uma divisão que está se tornando típica. De um lado, os Estados Unidos semeiam incertezas ao destruir semanas de negociações meticulosas e intensificar as ameaças tarifárias. Do outro, a União Europeia e outros parceiros comerciais americanos estreitam laços e lançam as bases para um sistema comercial global que gira cada vez menos em torno de um Estados Unidos cada vez mais inconstante.
“O comércio livre e justo impulsiona a prosperidade, cria empregos e fortalece as cadeias de abastecimento”, escreveu António Costa, presidente do Conselho Europeu, nas redes sociais no sábado. O conselho reúne os chefes de Estado e de governo de todo o bloco. “Continuaremos a construir parcerias comerciais sólidas em todo o mundo.”
Será difícil afastar-se dos Estados Unidos, porque são a maior economia do mundo, com um mercado de consumo dinâmico e tecnologias e serviços de ponta.
Trump já recuou de ameaças de tarifas antes e indicou disposição para negociar essas tarifas antes de sua data de vigência em 1º de agosto — e a União Europeia e outras economias estão preparadas para continuar com as negociações.
Mas o clima está cada vez mais hostil. Trump está “instrumentalizando a incerteza” para tentar forçar os parceiros comerciais dos Estados Unidos a fazer concessões, disse Mujtaba Rahman, diretor-gerente para a Europa do grupo Eurasia, chamando os últimos anúncios de “mudança completa das regras do jogo”.
O anúncio de Trump no sábado intensificou os apelos na Europa por uma retaliação imediata. O bloco já criou um pacote retaliatório, que será ativado na manhã de terça-feira a menos que os formuladores de políticas da UE o suspendam.
Responsáveis pelo comércio estão sob pressão para responder a Trump com uma demonstração de força. Brando Benifei, que lidera a delegação para relações com os Estados Unidos no Parlamento Europeu, instou o ramo executivo da UE a permitir que a retaliação entre em vigor — e a elaborar planos para uma resposta ainda mais agressiva até 1º de agosto.
“Trump está tentando dividir e assustar a Europa,” ele disse. Embaixadores da União Europeia se reunirão em Bruxelas na tarde de domingo para discutir o que fazer sobre o comércio, disse um diplomata da UE.
Mas revidar é apenas um primeiro passo; aproximar-se de aliados externos pode se mostrar ainda mais significativo a longo prazo. Desde que o impulso de Trump para reordenar o sistema de comércio começou em fevereiro, a União Europeia tem se esforçado para estabelecer novos acordos comerciais e aprofundar os existentes.
Canadá e a União Europeia se uniram. Reino Unido e União Europeia tiveram uma reaproximação cinco anos após os britânicos deixarem oficialmente da união. O bloco trabalha para estreitar as relações comerciais com Índia e África do Sul, e com países da América do Sul e Ásia.
A União Europeia não é o único poder global que adotou essa estratégia. O Canadá também está se aproximando do Sudeste Asiático, enquanto Brasil e México trabalham para aprofundar seus vínculos.
Oficiais até sugeriram a ideia de construir estruturas comerciais que excluam os Estados Unidos e a China, que é acusada de inflar suas fábricas a ponto de produzirem demais e inundarem os mercados globais com produtos baratos.
Von der Leyen sugeriu recentemente que a Europa poderia buscar uma nova colaboração entre o bloco e um grupo comercial de 11 países que inclui Japão, Vietnã e Austrália, mas que não incluía os Estados Unidos ou a China.
Laços mais estreitos entre a Europa e a Indonésia poderiam ajudar ambos os lados a suavizar o efeito do recuo dos Estados Unidos. Airlangga Hartarto, o ministro indonésio de assuntos econômicos, disse em uma entrevista na quinta-feira em Washington que, embora esperasse alcançar um acordo para desarmar as tarifas americanas, seu país estava diversificando suas relações caso as tarifas permanecessem.
Se Trump impuser as tarifas ameaçadas, as exportações da Indonésia para os Estados Unidos cairiam, ele disse, e mais de 300.000 indonésios poderiam perder seus empregos.
Mas as exportações da Indonésia de vestuário, calçados, cobre, aço inoxidável e outros produtos poderiam encontrar outros destinos, incluindo a Europa, graças ao pacto recém-negociado.
Após o acordo com a Europa ser ratificado por ambos os países, a maioria das tarifas de ambos os lados seria “próxima de zero”, disse Airlangga.
Uma questão chave, disseram os analistas, é se os aliados americanos irão além. Em vez de simplesmente colaborar mais uns com os outros e deixar os Estados Unidos de fora, eles poderiam realmente se unir para contrariar os Estados Unidos?
Grandes economias poderiam considerar coordenar sua retaliação à última rodada de tarifas de Trump, disse Jacob Funk Kirkegaard, um pesquisador sênior na Bruegel, uma organização de pesquisa de política econômica em Bruxelas. Unir-se poderia dar-lhes mais capacidade de barganha. “Eu começaria a procurar por coordenação,” ele disse. “É a coisa racional a se fazer.”
