MUNDO
Guerra na Ucrânia vai manter inflação e juros em patamares elevados por mais tempo
A convivência dos brasileiros com o amargo cenário de inflação e juros em níveis elevados deve persistir por um período maior do que o previsto anteriormente. O movimento ocorre em meio às incertezas causadas pela guerra na Ucrânia, que têm elevado o preço das matérias-primas em todo o mundo.
Mesmo antes do início do conflito, os brasileiros já conviviam com o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) acima dos dois dígitos no acumulado de 12 meses. A persistência da inflação no patamar elevado foi decisiva para a elevação da taxa básica de juros a 11,75% ao ano, maior nível em quase cinco anos.
Ao decidir a favor da alta de 1 ponto percentual dos juros básicos, o Copom (Comitê de Política Monetária) cita que os ataques no leste europeu elevaram as incertezas econômicas no mundo. A avaliação é de que o cenário resulte em novos estragos ao bolso dos consumidores.
“O choque de oferta decorrente do conflito tem o potencial de exacerbar as pressões inflacionárias que já vinham se acumulando tanto em economias emergentes quanto avançadas”, destacam os diretores do BC (Banco Central) ao prever uma nova alta de igual magnitude no próximo encontro do grupo.
Luciana Ikedo, assessora de investimentos e sócia no escritório RV4 Investimentos, recorda que a origem da alta dos preços no Brasil ocorreu com os estímulos para conter os efeitos da pandemia e agora será agravado pela guerra na Ucrânia.
“A expectativa é sim de que, em um curto prazo, haja um aperto da inflação. Sentiremos mais e, em decorrência disso, a elevação dos juros será um remédio que ajuda a controlar os preços”, avalia ela.
As percepções levam em conta que a taxa Selic é o principal instrumento de política monetária no combate à inflação. Isso acontece porque os juros mais altos encarecem o crédito, reduzem a disposição para consumir e estimulam novas alternativas de investimento pelas famílias.
Rachel de Sá, chefe de economia da Rico Investimentos, no entanto, explica que persistência do cenário adverso ocorre devido à defasagem entre a decisão pela alta dos juros e seu reflexo efetivo. “A política monetária de hoje será sentida dentro de um período entre nove meses e um ano.”
Ainda que o movimento persistente seja uma realidade, Fábio Astrauskas, professor do Insper e CEO da Siegem Condiltoria, afirma que apenas a elevação dos juros não conterá a inflação no Brasil. Ele alerta para o risco de o ciclo de altas da taxa Selic dificultar o crescimento econômico.
“Em algum momento breve, provavelmente a partir do segundo semestre, o BC começará a correr o risco de levar o país para uma recessão com inflação alta, porque juros muito altos derrubam o crescimento já cambaleante da economia brasileira”, explica Astrauskas.
Entre as altas de preços que mais devem assustar os consumidores aparecem as commodities (matérias-primas com cotação internacional), tais como combustíveis e grãos, e os fertilizantes, produzidos em larga escala pela Rússia.
Diante do conflito, o barril do petróleo tipo Brent, referência para o mercado de combustíveis, superou os US$ 100 pela primeira vez desde 2014. A valorização do óleo foi o principal motivo para o recente reajuste da gasolina e do diesel nas refinarias brasileiras.
Rachel reforça que os vereditos do Copom a respeito da taxa básica de juros apontam para o futuro e não têm efeitos imediatos. “Se o Banco Central subisse a Selic em 5 pontos percentuais, o preço da gasolina não mudaria. Iriamos apenas ver os preços subindo mais devagar no longo prazo”, destaca a chefe de economia da Rico.