MUNDO
Os peixes que se escondem atrás de outros para caçar
Um estudo conduzido por cientistas na Inglaterra descobriu que um tipo de peixe de recife no Caribe se esconde atrás de outros para caçar.
É a primeira evidência de um predador que adota esse comportamento para atacar suas presas.
Os peixes-trombeta (Aulostomus maculatus) são peixes predadores abundantes nos recifes de coral do Caribe.
Eles atacam pequenos peixes de recife e adotam várias estratégias de caça diferentes, incluindo flutuar de cabeça para baixo à espera de suas presas.
Os mergulhadores relatam regularmente ver o peixe-trombeta nadando próximo a um peixe maior, tipicamente menos ameaçador, como um peixe-papagaio ou cirurgião-patela, em uma prática conhecida como “sombreamento”.
A suposição, portanto, era que esse comportamento permitia que o peixe-trombeta se aproximasse de suas presas sem ser visto, mas essa hipótese nunca havia sido testada — até agora.
Enquanto mergulhava nos recifes de corais da ilha caribenha holandesa de Curaçao, a equipe de pesquisadores liderada por Sam Matchette, do Departamento de Zoologia da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, montou uma estrutura com uma série de protótipos de peixes-trombeta e peixes-papagaio impressos em 3D ao longo de uma linha de náilon na água.
Os protótipos foram posicionados um a um, em meio a grupos de donzelas- bicolores (Stegastes partitus) — a refeição favorita do peixe-trombeta.
O donzela-bicolor, um pequeno peixe tropical, reage a predadores em potencial observando aqueles que se aproximam e fugindo em direção ao seu abrigo ao menor sinal de ameaça.
A equipe de cientistas, então, filmou e analisou suas reações a cada protótipo, para ver se os donzelas-bicolores poderiam detectar um peixe-trombeta escondido.
Eles constataram que, ao observar um protótipo de peixe-trombeta sozinho em movimento, o donzela-bicolor nadava para inspecioná-lo e imediatamente voltava para a segurança de seu abrigo.
Já ante a um protótipo de um peixe-papagaio-caribenho ou odião-comum (Sparisoma viride), não fugia.
E, quando a equipe de cientistas posicionou um protótipo do peixe-trombeta ao lado do de um modelo de peixe-papagaio (para replicar o comportamento de sombreamento do peixe-trombeta verdadeiro), o donzela-bicolor reagiu quase da mesma forma que quando observou um modelo de peixe-papagaio movimentando-se sozinho: não detectou o peixe-trombeta escondido.
Importância do disfarce
Mesmo os melhores disfarces tornam-se perceptíveis quando estão em movimento.
Os animais podem ter dificuldade para equilibrar sua necessidade de se movimentar com a de permanecerem escondidos, e a evolução os ajudou a desenvolver algumas soluções criativas.
Por exemplo, a aranha que se enrola (Dolophones conifera), encontrada na Austrália, tece uma nova teia todas as noites.
Ao amanhecer, ela destrói a teia e usa sua barriga côncava para se achatar na curva de um galho de árvore e se esconder dos pássaros durante o dia.
E duas espécies de polvos “caminham” sobre dois tentáculos fingindo ser plantas e se esconderem de predadores.
Existem outros benefícios desse tipo de comportamento.
Por exemplo, o pequeno peixe-trombeta pode se beneficiar por ser menos visível para seus predadores, bem como para suas presas.
Esconder-se dessa maneira também pode reduzir o número de encontros agressivos que ele tem com espécies territoriais.
Impacto das mudanças climáticas
Predadores costumam usar a paisagem dos seus habitats para caçar suas presas, escondendo-se entre rochas ou vegetação, por exemplo.
Assim, o uso de outros animais pode ser uma alternativa quando essa “cobertura” não está disponível.
De fato, em um estudo anterior, a equipe de cientistas da Universidade de Cambridge descobriu que o comportamento de sombreamento era mais comum em habitats menos complexos, como recifes de corais irregulares.
Os recifes de coral em todo o mundo estão em declínio por fatores como mudanças climáticas, poluição e acidificação dos oceanos.
Por causa disso, vêm tornando-se irregulares, menos complexos e menos biodiversos.
Dada essa tendência, cientistas acreditam que esse comportamento de “sombreamento” pode se tornar mais contumaz no futuro.