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MUNDO

Qual o possível impacto de um dólar digital sobre as stablecoins?

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Durante as audiências de recondução de Jerome Powell ao Fed, no Senado dos Estados Unidos, em 11 de janeiro deste ano, o senador Patrick Toomey fez uma pergunta ao atual e futuro chefe do Federal Reserve: “Se o Congresso autorizasse e o Fed desenvolvesse um dólar digital do Banco Central, há algo nisso que poderia impedir uma stablecoin de emissão privada, bem regulamentada, de coexistir com a moeda digital ‘oficial’?”

“Não. De jeito nenhum”, respondeu Powell – uma resposta que trouxe, certamente, algum alívio para a comunidade de criptomoedas. Pelo menos o Fed não parece estar pensando em banir as stablecoins. Essa não é uma ameaça no momento.

No entanto, Toomey levantou uma questão importante e permanente: as stablecoins e um dólar digital do Federal Reserve poderiam realmente coexistir? Se os americanos tivessem contas de varejo no Federal Reserve – como Toomey postulou, no que pode ser um cenário exagerado – “e o Fed se torna o banqueiro comercial da América”, por que alguém precisaria de stablecoins? Ou mesmo de bancos comerciais tradicionais para esse assunto?

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Origem da discussão

De fato, em um relatório sobre essa discussão, divulgado no dia 20 de janeiro, o Fed citou diversos riscos potenciais associados a um dólar digital. Um deles seria o de uma CBDC substituir, efetivamente, o dinheiro disponível nos bancos comerciais. Esse documento tinha como objetivo obter comentários do público, mas o Fed não indicou, em outros contextos, interesse real em lançar uma moeda digital – apesar dos esforços de outros países, como a China, nesse sentido.

Nem todo mundo acredita que ambos os tipos de moedas poderiam coexistir. “Um dólar digital que fosse amplamente e facilmente acessível certamente prejudicaria a situação de stablecoins de emissão privada”, diz Eswar Prasad, professor de economia da Universidade de Cornell e autor do livro The Future of Money. Apesar disso, ele pontua que “stablecoins emitidas por grandes corporações ainda poderiam ter tração, particularmente dentro dos ecossistemas comerciais ou financeiros dessas empresas”.

Outras fontes imaginam a possibilidade de usos separados e distintos para uma moeda digital de banco central (CBDC), grupo que incluiria um dólar digital dos EUA, e as stablecoins. “Definitivamente, existem alguns usos distintos em potencial para cada caso”, diz Darrell Duffie, professor de administração de Adams e professor de finanças na Graduate School of Business da Universidade de Stanford. “Por exemplo, é improvável que o Fed forneça contas CBDC a um amplo espectro de consumidores estrangeiros”, e as stablecoins atreladas ao dólar podem ser muito úteis para realizar pagamentos e concluir acordos internacionais – o que atenderia a uma necessidade real dos negócios, sugeriu ele.

Propósitos distintos?
Haveria, de fato, usos distintos para um dólar digital e stablecoins de emissão privada – ou é provável que as stablecoins acabem sendo substituídas por CBDCs no mundo todo, eventualmente?

“Stablecoins são diferentes da maioria das CBDCs em sua forma de criação e propósito”, diz Matt Higginson, sócio da McKinsey e líder de iniciativas globais de blockchain e ativos digitais da consultoria. As CBDCs geralmente visam melhorar a inclusão financeira, reduzir o custo do dinheiro e, até certo ponto, rastrear transações financeiras (para combate à lavagem de dinheiro, por exemplo). As stablecoins, por outro lado, são dinheiro tokenizado atrelado ao dólar, com o fim de melhorar a rapidez e a eficiência dos pagamentos. “Suas características essenciais são mesmo muito diferentes, então não há razão para que elas não coexistam”, diz Higginson.

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Um dólar digital não diz respeito, efetivamente, à tecnologia ou à eficiência, diz Jonas Gross, presidente da Digital Euro Association. Tal como ocorre com as CBDCs em geral, “ele poderia ser mais eficiente ou estável para lidar com um alto rendimento de transações comerciais, onde uma Distributed Ledger Technology (DLT) não seria necessária ou onde as pessoas poderiam preferir a segurança, solidez e interoperabilidade de uma moeda apoiada pelo banco central”.

As stablecoins, em comparação, “focam em aspectos tecnológicos e permitem pagamentos eficientes, devido à remoção de intermediários e a modelos de negócios inovadores”, diz Gross. Os dois tipos poderiam ser preferidos por diferentes círculos de usuários e, presumivelmente, coexistir.

Alguns países também podem preferir dolarizar suas economias usando uma stablecoin com lastro em dólar, acrescenta Duffie. “E alguns deles podem acabar dolarizados contra a vontade de seus bancos centrais.” Nem todas as CBDCs precisam ser baseadas em blockchain ou em tecnologia de contabilidade digital, como observa Duffie, acrescentando:

“Suponha que uma CBDC não seja baseada em DLT e queiramos aproveitar a tecnologia de smart contracts (contratos inteligentes), bem como outras aplicações em DLT, seja no atacado ou no varejo. As stablecoins podem ter um papel útil nisso.”

Mesmo Prasad não descarta a possibilidade de coexistência entre os dois tipos de moedas: “Stablecoins e moedas digitais do banco central podem ser vistas como formas de pagamento complementares, mesmo que venham a pisar nos dedos uma da outra ao executarem nessa função”.

Uma mudança de mentalidade?

Em sua audiência de recondução ao Fed, Powell pareceu tender mais às criptomoedas do que em julho de 2021, quando disse aos legisladores norte-americanos: “Você não precisaria de stablecoins; você não precisaria de criptomoedas se tivesse uma moeda digital dos EUA”, usando isso como um argumento a favor da criação de um dólar digital pelo Fed. O que pode ter motivado essa mudança radical, supondo que ela realmente ocorreu?

“As instituições dos EUA, incluindo o Fed e outras instâncias reguladoras, parecem ter entendido que as stablecoins podem fornecer um ótimo suporte para o dólar americano”, opina Gross. Por quê? “As principais stablecoins são lastreadas pelo dólar americano”. Ou seja, se elas fortalecerem sua posição como meio de pagamento com criptomoedas, “isso significa que o dólar americano ganhará importância”.

Prasad tem outra opinião. Segundo ele, a postura mais moderada do presidente do Fed sobre as stablecoins pode ser o resultado de “ele estar satisfeito com as ações consideradas pelo Congresso e por diversass agências reguladoras para colocar as criptomoedas privadas sob uma supervisão mais rígida”.

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