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MUNDO

Vacinação contra covid: 5 perguntas definem quantas doses tomaremos no futuro

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O rápido espalhamento da variante ômicron mundo afora levantou duas questões importantes: será que precisaremos de vacinas atualizadas para lidar com essa ou com as novas versões do coronavírus que podem surgir nos próximos meses? E, se isso for realmente necessário, será que todo mundo deverá tomar novas doses a cada ano?

Por ora, a ciência parece ter mais dúvidas do que certezas a respeito desses pontos. Não existe definição sobre se a vacinação contra a covid-19 será anual ou se as três doses oferecidas atualmente para boa parte da população serão suficientes para conferir uma proteção forte e duradoura.

A experiência com outras doenças mostra que os dois caminhos são possíveis. Temos vacinas que precisam ser aplicadas poucas vezes na vida, caso daquelas que protegem contra febre amarela ou sarampo, e outras que requerem reaplicações periódicas, como os produtos que resguardam contra a gripe (doses anuais) ou contra o tétano (uma dose a cada dez anos).

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Para saber melhor o futuro da vacinação contra a covid-19, especialistas ouvidos pela BBC News Brasil avaliam que é preciso ter respostas claras para cinco perguntas básicas, que você confere a seguir.

1. Quanto tempo dura a imunidade após a terceira dose?

Com exceção da Janssen, todas as outras vacinas contra a covid-19 utilizadas em boa parte do mundo tinham um esquema inicial com duas doses.

Esses produtos foram testados e aprovados com um objetivo principal: diminuir o risco de desenvolver as formas mais graves da doença, que estão relacionadas à hospitalização e morte.

E, como era de se esperar, o avanço da campanha de vacinação em vários países foi seguido por uma queda importante nos casos, nas internações e nos óbitos relacionados à infecção pelo coronavírus.

No segundo semestre de 2021, porém, algumas pesquisas começaram a indicar que a resposta imune obtida após a aplicação das duas doses diminuía com o passar do tempo — no caso da CoronaVac, por exemplo, foi observada uma queda importante nos anticorpos entre quatro e seis meses depois de completado o esquema vacinal primário.

Esses estudos fizeram com que alguns países logo adotassem a política de oferecer uma terceira dose, primeiro para idosos e indivíduos com sistema imune comprometido, depois para todos os adultos.

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Embora essa decisão não fosse consenso entre toda a comunidade científica até novembro, a necessidade de uma terceira dose virou quase unanimidade com o aparecimento da ômicron no final de 2021.

Um dos motivos para isso é o fato de a variante carregar uma quantidade considerável de mutações genéticas na proteína S, sigla para spike (ou espícula, em português), a estrutura do coronavírus que se conecta às nossas células e dá início à infecção.

O grande problema é que as principais vacinas disponíveis, como as de Pfizer, AstraZeneca e Janssen, são baseadas justamente na tal da espícula do vírus “original”, detectado inicialmente em Wuhan, na China, no final de 2019.

Ou seja: uma transformação importante na espícula, como aconteceu com a ômicron, pode significar que a resposta imunológica obtida após a vacinação deixe de funcionar tão bem como observado até então, e não consiga mais identificar e barrar as novas versões virais.

Ilustração de uma célula e do coronavírus
A espícula (estrutura vermelha) se conecta com receptores da célula (estrutura azul) para dar início à infecção. CRÉDITO,GETTY IMAGES

Na prática, as vacinas realmente perderam parte de seu poder diante dessa nova variante. No caso do imunizante da AstraZeneca, por exemplo, cientistas do Imperial College, do Reino Unido, calcularam que a efetividade das duas doses contra a infecção sintomática pela ômicron despenca para 0 a 20% (antes, ela alcançava até os 90%).

A boa notícia é que esse mesmo grupo observou que dá para restaurar boa parte dessa proteção com uma terceira dose de vacina: no estudo, após o reforço, a efetividade subiu novamente para 55 a 80%. O mesmo fenômeno também ocorreu com outros imunizantes.

“Sabemos que a ômicron adquiriu maior resistência às vacinas, mas ela não é completamente resistente. Ela consegue escapar parcialmente dos anticorpos, mas ainda há uma proteção importante, especialmente após as três doses”, avalia o virologista Flávio da Fonseca, professor da Universidade Federal de Minas Gerais.

“As vacinas que temos agora estão funcionando, com alta proteção contra hospitalizações e óbitos. E é justamente isso o que nós queremos delas”, concorda a epidemiologista Denise Garrett, vice-presidente do Instituto Sabin de Vacinas, nos Estados Unidos.

Os dados de vida real mostram a importância das três doses, como revelam os gráficos do sistema de saúde de Nova York, também nos EUA. Nas duas primeiras semanas de janeiro, é possível observar cinco vezes mais casos de covid, sete vezes mais hospitalizações e cinco vezes mais mortes em indivíduos que não foram vacinados na cidade.

Gráfico de hospitalizações por covid em Nova York
Em Nova York, a taxa de hospitalizações de não vacinados (linha roxa) é quase sete vezes maior do que a de vacinados (linha laranja). CRÉDITO,DIVULGAÇÃO/NYC HEALTH

Mas aí vem a grande pergunta: a proteção da terceira dose dura quanto tempo? Será que ela também vai cair daqui a alguns meses, como observado após o esquema primário com as duas aplicações? Se sim, haverá necessidade de um novo reforço vacinal? Por ora, ninguém tem certeza sobre essas questões.

Numa entrevista recente, o imunologista Anthony Fauci, líder da resposta à pandemia nos Estados Unidos, apresentou algumas sugestões do que pode acontecer.

“Penso que após a primeira, a segunda, a terceira e, quem sabe, a quarta dose, é provável que tenhamos um nível de proteção que pode transformar a covid num quadro leve, ou sem sintomas. E aí o coronavírus ficará cada vez mais próximo de outros causadores do resfriado comum”, projeta.

O médico José Cassio de Moraes, professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, aponta algumas incertezas sobre esse cenário futuro. “Nós ainda não temos um correlato de proteção, ou seja, qual é a quantidade de anticorpos que precisamos para não pegarmos a covid.”

“Precisamos observar os próximos meses, para conferir se essa diferença de proteção que vemos hoje entre vacinados e não vacinados diminui ou se ela se mantém com o passar do tempo” complementa o especialista, que também representa a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco).

E vale lembrar aqui que nem só de anticorpos vive a resposta imunológica. Existem várias camadas de proteção que também ajudam a eliminar os agentes invasores do organismo.

“Fazer anticorpos e manter as ‘fronteiras fechadas’ é algo muito custoso para o corpo. Se o vírus não aparece, é natural que esse sistema se desmantele após algum tempo”, ensina o clínico e imunologista Eduardo Finger, coordenador do Laboratório de Pesquisa Experimental do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo.

“Mas essa expertise não se perde. Ela fica ‘guardada’ nas células de memória do sistema imune, que são ativadas e montam uma resposta rapidamente caso o vírus apareça. Com isso, a pessoa pode até se infectar, mas o patógeno não vai ter acesso livre aos órgãos vitais”, completa.

É justamente isso que parece estar acontecendo agora: pessoas que tiveram covid anteriormente ou estão vacinadas com duas ou três doses até pegam a ômicron, mas na grande maioria das vezes os sintomas são mais leves e não ocorrem grandes complicações pulmonares. Ou seja: nesses casos, o vírus até conseguiu escapar da primeira barreira de proteção (os anticorpos), mas logo as células de memória são ativadas e impedem um mal maior.

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