POLÍCIA
Tio do governador do AC investigado em suposto esquema de corrupção é exonerado da Secretaria de Indústria
Após três anos no comando da Secretaria de Estado de Indústria, Ciência e Tecnologia do Acre, Anderson Abreu de Lima, foi exonerado do cargo nesta quarta-feira (19). Ele é um dos alvos da Operação Ptolomeu, da Polícia Federal, que investiga supostos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro por membros ligados ao governo e estava afastado das funções públicas por determinação judicial.
A exoneração, assinada pelo governador Gladson Cameli, saiu no Diário Oficial do Estado (DOE) desta quarta e diz que foi “a pedido” do gestor. Ao g1, a secretária de Comunicação, Nayara Lessa, disse que o governo não vai se manifestar sobre a exoneração. Por enquanto, Adriano Sales Santos assume interinamente.
Lima é tio de Gladson Cameli e, segundo as investigações da Polícia Federal, é representante legal de uma das contas bancárias do governador. Ele estava à frente da secretaria desde o início do mandato de Cameli, em janeiro de 2019.
Desde a deflagração da operação, o agora ex-secretário estava afastado do cargo e proibido de acessar repartições públicas estaduais e de manter contato com os demais investigados.
A operação Ptolomeu investiga supostos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro por membros ligados ao governo do Acre. A Polícia Federal, com apoio da Controladoria-Geral da União (CGU), deflagrou, no dia 16 de dezembro do ano passado, a primeira fase da operação, quando foram cumpridos 41 mandados de busca e apreensão e um mandado de prisão no Acre, Amazonas e Distrito Federal.
Na 2ª fase, a Polícia Federal disse que foi detectado que servidores públicos estavam obstruindo a investigação, na tentativa de destruir provas essenciais para a continuidade das apurações, após a deflagração da 1ª fase. Um vídeo, que a Rede Amazônica teve acesso com exclusividade, mostra investigados ocultando celulares durante a deflagração da 1ª fase da ação.
Sobre a segunda fase da operação, o governo do Acre se posicionou, por meio de nota, e disse que “o governador Gladson Cameli mais uma vez manifesta respeito, bem como colabora com todos os passos da investigação, de modo que fique esclarecido que o governo sempre agiu dentro da legalidade e do interesse público.”
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), que autorizou a operação, determinou o afastamento das funções públicas dos envolvidos. A PF apreendeu mais de R$ 3,4 milhões entre dinheiro e bens de investigados
- Seis veículos, estimados em R$ 1,7 milhão;
- R$ 600 mil em espécie, entre dólares, euros e reais;
- 33 relógios e 10 joias de alto valor, totalizando mais de R$ 1 milhão, aproximadamente;
- R$139 mil reais em celulares apreendidos.
Operação Ptolomeu: PF apreende mais de R$ 3,4 milhões entre dinheiro e bens de investigados no AC — Foto: Divulgação/Polícia Federal-AC
O apartamento do governador do estado, Gladson Cameli (PP) foi um dos locais onde as buscas foram realizadas. Além disso, os policiais estiveram no escritório do governador; Palácio Rio Branco e Casa Civil. Em nota, o governo do estado disse que está contribuindo com as investigações e, nas redes sociais, o governador informou que continua cumprindo agenda e suas obrigações institucionais.
Além do governador, servidores públicos do Acre e familiares do gestor em Manaus (AM) foram alvos da operação.
Saiba quem são os alvos de operação da PF contra cúpula do governo do Acre — Foto: Reprodução
Saiba quem são os alvos:
- Ana Paula Correia da Silva Cameli: esposa do governador e que seria uma das beneficiárias do esquema. Atualmente, ela está proibida de acessar repartições de órgãos públicos estaduais e de manter contato com demais investigados.
- Anderson Abreu de Lima: tio do governador e secretário de Estado de Ciência e Tecnologia no Acre. Ele é representante legal de uma das contas bancárias do governador. Atualmente afastado do cargo, também está proibido de acessar repartições públicas estaduais e de manter contato com os demais investigados.
- Rosângela da Gama Pereira Pequeno: ex-coordenadora de gabinete do governador e também representante legal de uma das contas bancárias de Gladson Cameli. Ela foi presa após aparecer em um vídeo escondendo um celular da PF, sendo exonerada um dia depois. Ela segue presa em Rio Branco.
- Rafael Batista Vieira: ocupa cargo comissionado no Senado Federal no gabinete da suplente de Gladson Cameli, além de ser um dos procuradores da conta corrente do governador.
- Sebastião Da Silva Rocha: funcionário de confiança de Gladson Cameli há quase duas décadas e era lotado no escritório regional do Governo do Acre em Brasília. Já efetuou depósitos em espécie na conta pessoal do governador, além de ter utilizado seu irmão (policial militar) para efetuar pagamentos do cartão de crédito do mesmo, segundo as investigações. Atualmente está afastado das funções.
- Amarildo Martins Camargo: chefe de segurança do governador, seria o responsável pelo transporte de R$ 70 mil em espécie para negociação de veículo. Segundo a PF, há fortes indícios de uso da função pública armada em prol de interesses privados do governador. Atualmente ele está afastado do cargo e proibido de manter contato com o governador.
Além disso, houve a prisão de Rudilei Estrela, por tentar interferir e influenciar testemunhas durante a investigação. Ele foi solto no dia 26 de dezembro, após vencer o prazo de prisão temporária.
Mandados cumpridos no Amazonas
- Eladio Messias Cameli, pai do governador;
- Gledson de Lima Cameli, irmão do governador;
- Construtora Rio Negro
- Construtora Etam
- Marmud Cameli & Cia Ltda
Eladio Messias Cameli, pai do governador e sócio da Construtora Etam Ltda, aparece como receptor de altos valores. Segundo a PF, nos oito primeiros meses da gestão de Gladson Cameli, foram depositados ao pai dele mais de meio milhão de reais. O irmão do governador, Gledson Cameli, também aparece como um dos beneficiados de algumas movimentações.
Operação Ptolomeu
A investigação da Polícia Federal, que desencadeou a Operação Ptolomeu em dezembro do ano passado, mostra que o governador do Acre, Gladson Cameli, seria o principal beneficiário de um suposto esquema de corrupção no alto escalão da gestão. A PF lista episódios de superfaturamento, propina, empresas fantasmas e movimentações bancárias com altos valores.
No inquérito detalhado, obtido pelo g1, a PF aponta que o esquema era dividido em núcleos compostos pelo próprio governador Gladson Cameli (Progressistas), a primeira-dama do Estado, Ana Paula Cameli, servidores públicos que ocupavam cargos de confiança no governo e empreiteiras da família Cameli, que atuam no Acre e também em Manaus.
O inquérito foi aberto pela Polícia Federal em julho do ano passado baseado em outras operações da polícia, que, segundo o relatório, mostravam a ligação do governador em algumas movimentações. O Relatório de Inteligência Financeira (RIF) teria apontado, a princípio, 35 comunicações de operações financeiras suspeitas e, destas, 20 possuíam Gladson Cameli como titular ou envolvido.
Somadas, as transações listadas alcançam o montante de mais de R$ 828 milhões datadas entre 2 de maio de 2015 e 30 de abril de 2020. Outro fato pontuado pela PF são os valores depositados na conta da primeira-dama do estado, Ana Paula Correia da Silva Cameli.
O que dizem as defesas
Os advogados de defesa do governador, Ticiano Figueiredo e Pedro Ivo Velloso, dizem ainda que todas as movimentações financeiras do governador são conhecidas, já que ele é empresário e também chefe de Estado. Alegam ainda que devem recorrer e pedir revisão do processo.
“Em razão disso, a defesa do Governador Gladson Cameli irá apresentar o recurso cabível e confia que a decisão será objeto de revisão. Apesar de discordar veementemente do que consta na investigação, a defesa vem expressar que confia plenamente no Poder Judiciário e nas instituições republicanas”, pontua.
O g1 entrou em contato com o advogado de defesa da ex-coordenadora de gabinete do governador, Rosângela Pequeno, Marco Antonio Palácio Dantas, mas ele não se posiciona sobre o processo, pois alega “não ser oportuno”.
Alessandro Callil, que atua na defesa de Rudilei Estrela, disse que que o processo está em segredo de justiça e entende que o melhor agora é não apresentar a versão dele publicamente. “Informamos que todas as explicações e fatos estão sendo apresentados no processo e nosso cliente está à disposição da polícia judiciária e judiciário para esclarecer qualquer fato”, salientou.
O empresário Eládio Cameli esclareceu que não possui contratações com o governo do Acre e afirma que inexiste movimentação de R$ 420 milhões em sua conta corrente. Ele emitiu a seguinte nota de esclarecimento:
- Ele e as empresas das quais é sócio não participaram de processos licitatórios ou de contratações diretas com o governo do Acre na atual gestão;
- Inexiste a movimentação de R$ 420 milhões em sua conta corrente;
- Todo seu patrimônio é fruto de décadas de trabalho, tendo como comprovar a origem lícita da integralidade do patrimônio;
- Ele confia da Justiça brasileira e espera que, ao final da investigação, seja verificada sua total isenção com relação a qualquer fato tratado na investigação.
Dos outros investigados, o g1 não conseguiu os contatos das defesas.