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POLÍCIA

Trégua entre facções e ‘profissionalização’ do tráfico ajudaram a reduzir mortes, dizem especialistas

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Os homicídios retomaram a trajetória de queda no Brasil em 2021 e alcançaram o menor o menor patamar desde 2007, ano em que o Fórum Brasileiro de Segurança Pública passou a coletar os dados. Foram 41 mil mortes no ano passado, segundo o índice nacional de homicídios criado pelo g1, com base em dados oficiais dos 26 estados e do Distrito Federal.

Segundo especialistas do FBSP e do NEV-USP, essa redução – que começou em 2018 e foi interrompida em 2020 – ocorre de forma diferente de acordo com o estado e é motivada por um conjunto de fatores:

  • Profissionalização do mercado de drogas brasileiro: “Mercados criminosos equilibrados, com competidores que aprenderam a conviver entre si ou que descobriram formas de regulamentar a relação entre eles, tendem a reduzir o total de conflitos fatais. (…) A existência de regras e a criação de uma ampla rede de parceiros, que se expandiu com os contatos com criminosos de outros estados feitos nos presídios federais, ajudaram (o PCC) a se tornar um importante distribuidor de drogas e de armas para quadrilhas de outros estados, transformando o mercado de drogas brasileiro, que passou a replicar o modelo criminoso paulista, se organizando a partir dos presídios estaduais”, diz Bruno Paes Manso, do NEV-USP.
  • Maior controle e influência dos governos sobre os criminosos: “O próprio modelo de negócio criado por esses grupos tornou as lideranças das diversas gangues prisionais mais vulneráveis e sujeitas a pressões dos governos. Como parte delas estava presa, suas ordens dadas de dentro do sistema penitenciário para os territórios estavam sendo mais vigiadas e acompanhadas pelas autoridades. Os governos e sistemas de justiça estaduais vinham acumulando e trocando informações que permitiram agir para reduzir os conflitos e punir as lideranças mais truculentas dentro das prisões, que foram levadas a exercer um comando mais diplomático, racional e lucrativo”, diz Bruno.
  • Apaziguamento de conflitos entre facções: “Entre 2016 e 2017 vivemos uma guerra entre dois grupos criminosos, o PCC e o Comando Vermelho, e essa guerra se alastrou por todo o país, especialmente em estados do Norte e Nordeste. A gente tem um apaziguamento desse conflito em alguns territórios e, em outro, tem um certo monopólio de algum grupo. Quando um grupo único vai se consolidando no território, tende a reduzir o conflito”, diz Samira Bueno, do FBSP.
  • Criação de programas de focalização e outras políticas públicas: “Várias unidades da federação adotaram, ao longo dos anos 2000 e 2010, programas de redução de homicídios pautados na focalização de ações nos territórios. O Pacto Pela Vida, em Pernambuco, o Estado Presente, no Espírito Santo, e o Ceará Pacífico, no Ceará, são exemplos de projetos que buscaram integrar ações policiais e medidas de caráter preventivo. Ao longo dos anos, muitos governadores titubearam na manutenção de tais iniciativas, mas houve um aprendizado organizacional das forças de segurança que mostra que, quando existe planejamento, integração e metas, os macros objetivos são mais rapidamente alcançados”, afirmam Samira Bueno e Renato Sérgio de Lima, do FBSP. Os especialistas também citam outras políticas públicas que estão sendo desenvolvidas pelas unidades da federação, focadas na integração das forças policiais com o fortalecimento dos mecanismos de inteligência e investigação.
  • Redução do número de jovens na população: “Tem a ver com as mudanças demográficas, algo que a gente já vem apontando há alguns anos no Atlas da Violência, que é a reduçao do número de jovens na populacão. É sabido que a maior parte da violência letal atinge jovens do sexo masculino. E o Brasil esta diante de uma grande mudança demográfica.”
  • Criação do SUSP e mudanças nas regras de repasses: “Em 2018, o governo federal conseguiu aprovar, depois de tramitar por 14 anos, a lei que criou o Sistema Único de Segurança Pública, responsável por regulamentar a Constituição de 1988 no que diz respeito à integração e eficiências das instituições de segurança pública. Ainda em 2018, (…) houve uma mudança nas regras de repasse de recursos arrecadados pelas Loterias da Caixa que, na prática, fez com que cerca de 80% de todo o dinheiro da segurança repassado para estados e Distrito Federal de 2019 a 2021 tenha as loterias como origem e, com isso, novos recursos puderam ser destinados à área”, dizem Samira e Renato.

Os pesquisadores destacam que a queda no índice de homicídios pode acontecer mesmo com a maior introdução de armas no país por conta dos decretos e mudanças na legislação promovidas pelo governo federal. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública publicado no ano passado, o Brasil dobrou o número de armas nas mãos de civis em apenas três anos.

“AS ARMAS E MUNIÇÕES LEGAIS E ILEGAIS – QUE SÃO DESVIADAS E INGRESSAM NO MERCADO DO CRIME – NÃO CAUSAM, ISOLADAMENTE, VARIAÇÕES NAS TAXAS. ELAS TENDEM A AUMENTAR OS HOMICÍDIOS CIRCUNSTANCIAIS, EM BARES, BOATES E NO TRÂNSITO, POR EXEMPLO, E OS FEMININÍDIOS. MAS NÃO AFETAM NECESSARIAMENTE AS DINÂMICAS CRIMINAIS NOS ESTADOS”, DIZ BRUNO PAES MANSO.

“O Rio de Janeiro é um exemplo. Apesar da imensa quantidade de fuzis nas mãos de traficantes e milicianos, que controlam diversas comunidades do estado graças a esse poder bélico, a atual força política dos milicianos tem inibido conflitos por poder e mercado, contribuindo para uma redução de mortes intencionais violentas que persistiu nos últimos quatro anos – mesmo com as prisões e impeachment dos seus chefes de executivos.”

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