Apesar de ser frequentemente colocada em isolamento, Marina contaria com o compromisso das demais pastas na agenda ambiental. O presidente Lula quis aplicar a chamada “transversalidade” da pauta em seu ministério.
Ainda na campanha de 2022, o petista apresentou sua intenção de transformar a política ambiental em um tema observado por todas as instâncias do governo federal.
Decisões do Congresso Nacional na última semana, porém, expuseram a falta de articulação política em matéria ambiental. Há uma avaliação de que a agenda não foi suficientemente encampada por ministros e pela base aliada do governo.
Em uma frente, a comissão do Congresso Nacional responsável por avaliar a medida provisória (MP) de reorganização da Esplanada dos Ministérios aprovou o relatório do deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL) que esvaziou o Ministério do Meio Ambiente.
O controle do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e da Política Nacional dos Recursos Hídricos foi retirado da pasta de Marina. Segundo o texto aprovado, o CAR passará para o Ministério da Gestão e da Inovação, chefiado por Esther Dweck. Já a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) irá para o Ministério de Integração e Desenvolvimento Regional), comandado por Waldez Góes.
Bancada ruralista arquitetou saída do cadastro rural do Meio Ambiente
Outro ponto que causou insatisfação entre membros do governo foi a devolução ao Ministério da Justiça da atribuição pela demarcação de terras indígenas e quilombolas. Na MP editada por Lula, a tarefa era responsabilidade do recém-criado Ministério dos Povos Indígenas, chefiado por Sonia Guajajara.
O texto ainda precisa passar pelos plenários da Câmara e do Senado. O presidente da República tem o poder de vetar trechos da matéria.
Em outro movimento, também ao longo da última semana, a Câmara aprovou a urgência do marco temporal das terras indígenas, tese adotada no PL nº 490/2007 e que reconhece que apenas as terras já ocupadas por povos originários em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, podem ter sua demarcação reivindicada. A medida é amplamente criticada por defensores da causa indígena, mas conta com apoio da bancada do agro.
Seis vice-líderes do governo aprovaram urgência do marco temporal
Dentro do Executivo, Marina tem enfrentado disputas políticas em torno da exploração de petróleo e gás natural na foz do Amazonas. A solicitação da Petrobras para perfuração foi inicialmente negada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama).
Em defesa do estudo do Ibama, a ministra chamou o instituto de “técnico”. Já o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, chamou as exigências do Ibama para a realização de novos estudos antes da perfuração de “uma incoerência e um absurdo”.
A estatal petroleira e o ministério têm puxado a corda e pressionado pela liberação, enquanto ambientalistas e parte da militância criticam o esvaziamento do discurso ambiental.
O desconforto levou à convocação de uma reunião, no Palácio do Planalto, entre Lula e as ministras Marina e Guajajara. A reunião tinha como objetivo central sinalizar para as ministras que elas seguiam prestigiadas dentro do governo.
Após o encontro, o ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, disse que o governo tentará resgatar a estrutura proposta inicialmente pelo governo.
Governo tentará reverter em plenário mudanças no papel de ministérios
Órgãos voltados ao tema ambiental
Na Secretaria-Executiva da pasta chefiada por Alexandre Silveira, por exemplo, há a Assessoria Especial de Meio Ambiente, que faz a articulação intra e intersetorial para empreendimentos nos setores de minas e energia.
Na Agricultura, há uma secretaria que, entre outras atribuições, trata do desenvolvimento sustentável. É também o caso do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços: a pasta comandada pelo vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) abriga a Secretaria de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria.
Com olhar voltado ao cenário internacional, o Itamaraty engloba a Secretaria de Clima, Energia e Meio Ambiente.
Vinculada à Secretaria-Executiva do Ministério dos Transportes, há a Subsecretaria de Sustentabilidade, que visa incorporar as boas práticas de gestão socioambiental e territorial nas fases de planejamento, implantação, expansão e operação da infraestrutura federal de transportes.
Por sua vez, na pasta de Portos e Aeroportos, tanto a Secretaria Nacional de Aviação Civil (SAC) quanto a Secretaria Nacional de Portos e Transportes Aquaviários (SNPTA) contam com departamentos aos quais compete subsidiar políticas, diretrizes e estudos de sustentabilidade ambiental em suas áreas específicas.
A nova Procuradoria Nacional de Defesa do Clima e do Meio Ambiente, unidade da AGU ligada diretamente ao gabinete do ministro Jorge Messias, tem, entre suas atribuições, o acompanhamento de demandas judiciais, extrajudiciais e consultivas relacionadas a meio ambiente e clima. O órgão também é responsável pela uniformização de entendimentos jurídicos para prevenir e solucionar controvérsias referentes ao tema.
No Ministério do Planejamento e Orçamento, pasta comandada por Simone Tebet, duas diretorias tratam do tema de forma transversal, ainda que ele não esteja nominalmente previsto: a Diretoria de Programas Sociais, Áreas Transversais e Multissetoriais e Participação Social (vinculada à Secretaria Nacional de Planejamento) e a Diretoria de Temas Transversais (ligada à Secretaria de Orçamento Federal).
Já sob a alçada do Ministério da Defesa, está o Conselho Deliberativo do Sistema de Proteção da Amazônia (Consipam), que coordena ações do governo federal na região.
Ministérios palacianos
Dos cinco ministérios ligados à Presidência da República, apenas a Secretaria de Relações Institucionais (SRI) possui uma estrutura nesse sentido. É a Comissão Nacional para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Ainda, a pasta abriga a Secretaria-Executiva do Conselho do Desenvolvimento Econômico, Social e Sustentável, o chamado “Conselhão”, resgatado dos primeiros governos Lula. Houve uma adição do tema da sustentabilidade na nova formatação.
O Gabinete de Segurança Institucional (GSI), a Secretaria de Comunicação Social (Secom) e a Secretaria-Geral não possuem órgãos similares.
Apesar de não possuir um órgão voltado à questão, a Casa Civil, em razão de sua função de coordenadora dos demais ministérios, analisa previamente todos os atos normativos sobre política ambiental que serão publicados.
Mesmo pastas que não possuem órgãos especialmente voltados à questão ambiental a tangenciam de alguma forma.
É o caso do Ministério de Direitos Humanos e Cidadania. Chefiada por Silvio Almeida, a pasta possui uma coordenação de proteção aos defensores de direitos humanos, comunicadores e ambientalistas.
O Ministério da Saúde também aborda o tema ao tratar da saúde indígena. Há um departamento que trabalha com questões ambientais relacionadas à saúde das comunidades.
O Metrópoles pediu comentário da Presidência da República e do Ministério do Meio Ambiente, mas não obteve retorno. O espaço segue aberto para manifestações.