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POLÍTICA

De IR a dividendo: o que pode mudar na “parte 2” da reforma tributária

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A reforma tributária sobre o consumo ainda precisa ser aprovada no Senado, mas o governo já começou a falar na “segunda fase” das mudanças: uma reforma sobre a tributação da renda.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse nesta semana que enviará uma proposta com foco na renda antes mesmo de a reforma sobre o consumo terminar de tramitar no Congresso. Nesse segundo projeto, são esperadas mudanças em frentes como alíquota do Imposto de Renda e na tributação de lucros e dividendos.

Os temas são promessas de campanha do governo Lula, mas a Fazenda optou por fatiar as reformas na tributação para garantir maior consenso: primeiro votar o consumo e, depois, a renda.

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Na primeira parte, as mudanças na tributação do consumo foram aprovadas na Câmara com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45, que legisla majoritariamente sobre a tributação do consumo e unificou cinco impostos – após décadas de discussões sobre o tema. O texto deve ser votado no Senado nos próximos meses.

O próprio texto da PEC sobre o consumo, no entanto, estabelece também que uma reforma sobre a renda deve ser enviada pelo governo em até 180 dias. Veja o que deve ser inserido na discussão.

Fim da isenção para dividendos

O Brasil é um dos poucos países do mundo que não tributa dividendos, e o tema tende a ser ponto central na futura reforma sobre a renda, segundo as sinalizações do governo.

Dividendos são a parte do lucro das empresas que é distribuído a acionistas. Dentre os membros ou associados da OCDE, que reúne algumas das principais economias do mundo, somente Brasil, Letônia e Estônia não tributam dividendos.

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A isenção para os dividendos ocorre no Brasil desde 1995, e um dos argumentos a favor desse modelo é evitar a fuga de capitais, além de antecipar o recolhimento dos tributos pela Receita Federal. Na outra ponta, defensores de uma reforma apontam que o modelo brasileiro gera distorções ao incentivar empresas a distribuírem lucros a acionistas em vez de reinvestir o montante em seu próprio crescimento e geração de novos empregos.

O governo Lula tende a usar como base parte de um projeto de lei (PL 2.337/21) que tramitou no governo Jair Bolsonaro: na época, o então ministro da Economia, Paulo Guedes, apoiava um texto que aumentaria a alíquota sobre dividendos de zero para ao menos 15%.

Redução na tributação de lucro das empresas

Paralelamente, é esperado que a tributação de dividendos seja feita junto a uma redução nas alíquotas que incidem diretamente sobre o lucro da empresa, o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

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Hoje, embora o lucro das empresas seja isento na pessoa física (isto é, via dividendos), os ganhos são pesadamente tributados na pessoa jurídica via IRPJ e CSLL. A carga brasileira sobre o lucro extraída diretamente das empresas é hoje de 34%, uma das maiores do mundo, segundo levantamento anual da organização Tax Foundation.

A maioria dos países europeus, Canadá e Estados Unidos têm alíquotas maiores no agregado, de mais de 40% ou 50%. Mas o custo é dividido com os dividendos, de modo que a carga direta sobre as empresas fica menor. Nos Estados Unidos, por exemplo, a tributação sobre o lucro na pessoa jurídica é em torno de 25%, e na pessoa física, via dividendos, em torno de 20% ou mais, a depender do caso.

Dúvidas sobre aumento da carga

O governo ainda não divulgou mais detalhes sobre de quanto seria uma redução no imposto corporativo. Se fosse seguido o que estava no antigo PL 2.337/21, a entrada dos dividendos no bolo faria a tributação direta sobre a pessoa jurídica cair de 34% para 25%, enquanto os dividendos arcariam com outros 15%, segundo estimativa do BTG Pactual.

Assim, no agregado, a carga tributária total sobre o lucro aumentaria de 34% para 40%.

Com o governo precisando fechar as contas para cumprir as metas do novo marco fiscal, no entanto, um aumento de carga maior do que isso não é descartado.

Portanto, uma das preocupações é sobre de quanto será a redução na frente corporativa para compensar a alta nos dividendos, diz Cláudio Batista, sócio da Domingues Sociedade de Advogados (DMGSA).

“Tributar mais os dividendos é uma medida no sentido de incentivar o reinvestimento e geração de riqueza dentro da empresa. Por outro lado, em alguma medida a empresa acaba pagando sobre o lucro e depois sobre o dividendo na pessoa física. Então, vai depender muito de quanto vai ser reduzido o imposto da pessoa jurídica”, diz.

“Enquanto a reforma do consumo é vista como algo que ajudará a simplificar, essa segunda [da renda] tem pontos que são menos consenso”, diz Batista.

Imposto de renda da pessoa física

Outra medida aguardada na fase dois da reforma é uma mudança na tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). O tema é uma promessa de campanha do governo Lula, que afirmou pretender isentar o IRPF para todos que ganham até R$ 5 mil.

Em maio, o governo tomou uma primeira medida nesse sentido e aumentou de R$ 1.900 para R$ 2.640 a faixa de isenção do IRPF.

O ministro Fernando Haddad disse em maio que chegar à isenção de R$ 5 mil é “desafiador”, mas que acreditava ser possível aumentar progressivamente a isenção para em torno de R$ 4 mil com a reforma.

Um passo inicial seria a correção da inflação acumulada na tabela do Imposto de Renda. Estudo publicado em janeiro pelo Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Sindifisco) mostrou que, se a tabela tivesse sido corrigida pela inflação desde 1996, estariam isentos do Imposto de Renda quem tem rendimento tributável de até R$ 4,6 mil. Quem está nessa faixa hoje não só paga o imposto, como está na alíquota máxima (27,5%).

Com a correção da tabela, pagaria a alíquota máxima quem tem rendimento tributável acima de R$ 11,6 mil.

O custo estimado para fazer essa correção geral, no entanto, é de renúncia de mais de R$ 100 bilhões.

“A correção da tabela do IRPF pelo índice inflacionário representa tão somente uma obrigação do governo em manter a carga tributária de um exercício para outro”, diz o Sindifisco no estudo, mas os autores reforçam que “tal medida de justiça fiscal deve vir acompanhada, necessariamente, de medidas de compensação da perda arrecadatória.”

Herança, fundos e dificuldade de consenso

Para compensar os custos de maior isenção no IRPF, podem entrar no radar outros temas, como as deduções hoje presentes no IRPF para gastos das famílias com educação e saúde privadas, tema que será espinhoso entre a classe média.

Também poderão estar no bolo da reforma uma maior tributação sobre heranças (hoje, o imposto é estadual e a alíquota máxima é de 8%), além de de fundos hoje isentos, como fundos imobiliários e os chamados fundos para “super ricos”. Ao todo, o Brasil tem hoje mais de R$ 450 bilhões em benefícios fiscais ao ano, montante que o governo espera reaver em partes com ambas as reformas tributárias.

O desafio, para o governo Lula, é que outros já falharam nessa tentativa. Quando Paulo Guedes tentou alterar vários desses pontos na tributação da renda – em uma proposta muito parecida à que o PT tenta emplacar hoje – houve reação intensa de setores da sociedades e parte das bancadas no Congresso. O texto chegou a passar na Câmara, mas travou no Senado.

Dessa vez, após vitórias em alguns temas-chave para o governo no primeiro semestre, Haddad acredita que a segunda fase da reforma possa tramitar junto ao Orçamento de 2024 até o fim do ano.

“Do mesmo jeito que o marco fiscal e a PEC [da reforma tributária] andaram juntos, o Orçamento terá de andar com a segunda fase. Para garantir as metas do marco fiscal, preciso que o Congresso aprecie essa segunda etapa com a peça orçamentária”, disse Haddad nesta semana em entrevista ao podcast O Assunto, do G1. Encontrar consenso para chegar lá, no entanto, será muito mais difícil do que foi na reforma sobre o consumo.

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