POLÍTICA
Defensor da exploração da Foz do Amazonas, Lula cobra fim de combustíveis fósseis na COP

Durante a abertura da Cúpula de Líderes da COP-30, realizada nesta quinta-feira, 6, em Belém, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) destacou o compromisso do Brasil com o combate à crise climática e propôs a construção de um “mapa do caminho” para substituir os combustíveis fósseis.
O discurso, no entanto, ocorre em meio a contradições na política ambiental do próprio governo, especialmente diante da liberação para atividades de exploração de petróleo na Margem Equatorial da Foz do Amazonas, tema que tem dividido ministérios e provocado críticas de ambientalistas.
Em sua fala, Lula afirmou que “acelerar a transição energética e proteger a natureza são as duas maneiras mais efetivas de conter o aquecimento global”. O presidente reconheceu que há obstáculos, mas reforçou a necessidade de cooperação global e planejamento.
“Estou convencido de que, apesar das nossas dificuldades e contradições, precisamos de mapas do caminho para, de forma justa e planejada, reverter o desmatamento, superar a dependência dos combustíveis fósseis e mobilizar os recursos necessários para esses objetivos”, disse Lula.
“Interesses egoístas imediatos preponderam o seu bem comum de longo prazo. É o momento de levar a sério os alertas da ciência. É hora de encarar a realidade e decidir se teremos ou não a coragem e a determinação necessárias para transformá-la”, acrescentou o presidente.
Contradições internas e o debate sobre o petróleo
Enquanto Lula enfatiza a importância de um modelo de desenvolvimento de baixo carbono, o governo mantém apoio à Petrobras, que conduz perfurações exploratórias na Margem Equatorial, área considerada estratégica por parlamentares e governadores do Norte, que veem na iniciativa uma fonte de arrecadação.
A proposta, porém, enfrenta resistência dentro do próprio governo. O Ministério do Meio Ambiente já havia criticado a exploração, e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) havia negado licenças anteriormente, citando falhas nos estudos de impacto ambiental e riscos à biodiversidade marinha. Mesmo assim, a Petrobras reapresentou o pedido, afirmando que há condições técnicas seguras para o trabalho.
Em outubro, o Ibama concedeu autorização para pesquisa exploratória na região, com duração prevista de cinco meses, para identificar o potencial de reservas de petróleo e gás.
Lula defendeu publicamente a decisão. “Se eu fosse um líder falso e mentiroso, eu esperaria passar a COP para anunciar”, disse o presidente em entrevista a jornalistas em Belém, reforçando que uma possível exploração comercial ainda dependerá de nova licença ambiental.
Antes disso, durante viagem oficial à Indonésia, o petista também justificou o projeto. “É fácil falar do fim do combustível fóssil, mas é difícil a gente dizer quem é que tem hoje condições de se libertar. Ninguém tem”, afirmou. “Enquanto o mundo precisar, o Brasil não vai jogar fora uma riqueza que pode melhorar a própria vida do povo brasileiro. Vamos continuar utilizando o dinheiro do petróleo para que a gente faça cada vez mais e tenhamos condições de o Brasil se ver livre de combustível fóssil”, acrescentou na ocasião.
Lula acrescentou ainda que essa ainda é uma autorização para fazer pesquisa na Margem Equatorial. “Entre fazer a pesquisa e ter petróleo, leva um tempo grande, porque precisa de novas licenças, e isso numa empresa que tem expertise. Você não tem histórico de a Petrobras ter vazado óleo em lugar algum.”
Na ocasião, o presidente destacou que o Brasil já é líder mundial em energia renovável, lembrando que “87% da nossa energia elétrica é limpa. A gasolina utiliza 30% de etanol. Estamos fazendo as coisas que têm que ser feitas corretamente e vamos continuar investindo em energia renovável.”
Presidente chegou a criticar Ibama
Essas defesas do presidente à exploração de petróleo não são de agora. Em fevereiro deste ano, em entrevista à Rádio Clube do Pará, Lula havia dito que Marina Silva “jamais será contra” a exploração de petróleo na Margem Equatorial, argumentando que a ministra é “uma pessoa inteligente” e que a discordância se refere ao método, não à atividade em si. “Não é ‘não quero’, é como fazer para não ser predatório com a nossa querida Amazônia.”
Dias antes, ao falar à Rádio Diário FM, de Macapá, o presidente criticou o que chamou de “lenga-lenga” e afirmou que o Ibama não pode parecer “ser contra o governo”.
Na ocasião, após as declarações de Lula, a Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Ascema) emitiu uma nota afirmando que o presidente estava tentando implementar interferências políticas no Ibama. A entidade classificou como “inadmissível” qualquer tipo de pressão sobre os técnicos do órgão.
No comunicado, os servidores criticaram a tentativa de pressão por parte de Lula. “É inadmissível qualquer tipo de pressão política que busque interferir no trabalho técnico do órgão, especialmente quando se trata de uma decisão que pode resultar em impactos ambientais irreversíveis”, dizia o texto.
Segundo a Ascema, as declarações do presidente desqualificaram o Ibama e desrespeitaram o papel da instituição. “O Ibama precisa ser reconhecido como órgão de Estado, motivo pelo qual propusemos uma emenda parlamentar para que passe a ter esse status e não fique sujeito a interferências políticas como a que o presidente Lula tenta implementar”, destacou a nota à época.
Os servidores também relembraram o papel do órgão durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro para evitar retrocessos e afirmaram que “continuarão atuando neste ou em qualquer outro governo que contrarie as necessidades de conservação socioambiental no Brasil.”









