POLÍTICA
Filho de Zé Dirceu lembra prisão do pai pelo mensalão e critica projeto bolsonarista por anistia: ‘Esse crime não se perdoa’

No julgamento que condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a mais de 27 anos de prisão por tentativa de golpe de Estado, ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e as defesas dos réus citaram diversas vezes o termo mensalão –esquema de compra de apoio político revelado durante o primeiro governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2005. Momento histórico jamais esquecido pelo deputado federal Zeca Dirceu (PT-PR), filho do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (PT), que foi preso em 2013.
“É um momento muito triste para mim, para a minha família, para as minhas irmãs. Minha avó ainda era viva, depois acabou falecendo”, contou Zeca Dirceu, em entrevista exclusiva ao Terra. Na época, ele, que se descreve como “petista antes de o PT existir”, tinha 27 anos e era recém-eleito prefeito de Cruzeiro do Oeste (PR).
De 2013 a 2019, o deputado presenciou muitas idas e vindas do pai para a prisão. O ex-ministro, que foi condenado e preso no processo do Mensalão, voltou para a prisão mais três vezes durante a Operação Lava Jato. Ao todo, foram aproximadamente 2 anos e três meses preso.
Uma parte da condenação de Dirceu pelo Mensalão foi anulada em 2014, e outra, perdoada via indulto em 2016. Depois, em 2024, o STF determinou a anulação de todos os atos processuais produzidos por Sérgio Moro em duas ações penais contra Zé Dirceu na Lava Jato, alegando parcialidade do ex-juiz, assim como ocorreu com Lula.
Para Zeca Dirceu, não há nenhum semelhança entre mensalão, Lava Jato e o julgamento de Bolsonaro. “Uma outra comparação que não tem nem pé nem cabeça. O presidente Lula foi condenado sem provas, por um juiz ladrão, que combinava com quem acusava, como seria a acusação para depois ele mesmo julgar. Isso é um dos crimes mais graves que existem no Poder Judiciário”, disse o deputado, refutando qualquer tese de alinhamento dos ministros do STF ao PT.
Ele lembrou que o mesmo STF que condenou Bolsonaro manteve Lula preso por 543 dias. O presidente foi preso em abril de 2018 e solto em novembro de 2019, tendo todas as suas condenações anuladas em 2021.
“Não são os amigos do Lula, não são ministros ligados à esquerda, ao comunismo, pelo contrário, são pessoas que foram duríssimas com o meu pai, com o Lula e com um conjunto muito grande de lideranças do PT. Senão esse pessoal não teria condenado o meu pai, não teria condenado o Lula.”
Zeca apontou uma diferença entre o comportamento do pai e de Lula, e o do ex-presidente. “Eu acho que a luta, a resiliência, o caráter do meu pai, do presidente Lula, a honradez deles, inclusive num momento de prisão, são marcas que ficaram positivas desse processo [mensalão]. O Bolsonaro fica aí chorando pelos cantos, mandando o filho ir para os Estados Unidos para tentar fazer chantagem contra o Brasil”, pontua ele. “Eu sou filho do José Dirceu e eu nunca tive esse tipo de atitude. Apesar de, naquela época, também já ocupar cargos públicos.”
“Não vai ter anistia”
José Dirceu foi beneficiado pela anistia política em 1979. Aliados do ex-presidente Bolsonaro vêm tentando aprovar um projeto de anistia irrestrita a todos os envolvidos na tentativa de golpe e no 8 de Janeiro. Para Zeca Dirceu, embora o recurso seja o mesmo – anistia -, os casos são diferentes.
“São situações opostas. Quem foi anistiado em 1979 lutou contra a Ditadura Militar. São jovens, estudantes, lideranças políticas que foram presas e torturadas. Você anistiou quem estava contra a Ditadura Militar. Meu pai era um dos líderes, foi eleito presidente da UNE, mas não conseguiu nem tomar posse porque foi preso no congresso de Ibiúna [SP]. Agora, é o contrário. Estão pedindo anistia para quem estava buscando e dando início a um processo de golpe para a volta da Ditadura”, ponderou.
Zeca Dirceu vê um “grande desespero dos bolsonaristas” e define o pedido de anistia para Bolsonaro e seus aliados como “uma coisa fantasiosa”.
“Não vai ter anistia. Isso não é uma palavra de efeito. Isso é um sentimento que a gente vê aqui. Vamos dizer que num azar, numa eventualidade, fosse pautado e aprovado na Câmara. Lá no Senado não vai prosperar”, relatou ele, que também acrescenta a inconstitucionalidade da medida.
“Para que aprovar uma coisa que não vai valer? Por que aprovar uma coisa que é inconstitucional? Por que esse tipo de crime não se perdoa, não se anistia. Está na Constituição. Não fui eu que inventei, não fui eu que escrevi.”
PT no Paraná: renovação e desafios eleitorais
Recentemente, Zeca disputou o comando do PT no Paraná, perdeu por pequena diferença, mas assumiu uma posição na direção Executiva do partido.
“Estou muito feliz com a experiência que eu vivi. Há um desejo muito grande no PT do Paraná por mudança e por renovação. A mudança já começou porque a gente teve uma renovação muito grande nos membros da direção estadual, e uma renovação maior ainda nos membros da direção nacional. Inclusive eu faço parte agora da direção nacional pela primeira vez, ao lado do meu pai, o que é um orgulho, é uma honra muito grande.”
O parlamentar avaliou o cenário político do Estado, tradicionalmente conservador, e destacou seu diálogo com diferentes perfis eleitorais.
“Claro que o Paraná é mais conservador. Minha região, Noroeste do Estado, é mais conservadora ainda. Mas sobrevivo, me elejo, porque faço política dialogando com quem pensa diferente de mim, até com quem não gosta de mim. Isso é da vida pública.”
Zeca Dirceu colocou seu nome à disposição para disputar a Prefeitura de Curitiba, mas o PT acabou apoiando Luciano Ducci, do PSB, deixando a legenda em segundo plano na disputa.
“Eu não sou contra alianças, pelo contrário, eu sou aliancista. O que eu não aceito, e foi o que foi feito em Curitiba, é você fazer uma aliança que te deixa vendido, escondido do processo, com alguém que é outra coisa, que não vai dar sequência na nossa relação. O Luciano Ducci nunca foi nosso aliado aqui, por exemplo, no Congresso, e continua não sendo. Claro que ele vota a favor do governo naqueles temas que têm pouca importância, mas nas questões que são polêmicas, que são difíceis, é só olhar a votação dele. E não é só ele, é um pouco a característica da bancada do Paraná, então eu nem trato como uma questão pessoal dele.”
