POLÍTICA
Moraes usa PCC para comparar mensagem entre Ramagem e Bolsonaro sobre trama golpista

Em seu voto no julgamento da trama golpista, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator do caso, recorreu a uma comparação com a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) para dimensionar a gravidade das mensagens trocadas entre o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) — então diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no governo Bolsonaro — e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
“Isso não é uma mensagem de um delinquente do PCC para outro. Isso é uma mensagem do então diretor da Abin para o presidente da República”, disse Moraes, sobre a conduta dos réus.
A fala de Moraes ocorreu após a leitura de mensagens trocadas entre o ex-presidente e o então diretor da Abin, interceptadas pela Polícia Federal. O ministro citou um trecho em que se lia:
“Na realidade, a urna já se encontra em total descrédito perante a população. Deve-se enaltecer essa questão já consolidada. A prova da vulnerabilidade já foi feita em 2018 antes das eleições. Resta somente trazê-la novamente e constantemente. Deve-se dar continuidade àqueles argumentos. Essas questões devem ser massificadas. A credibilidade da urna já se esvaiu, assim como a reputação de ministros do Supremo Tribunal Federal”.
De acordo com o relator, as mensagens demonstram que os réus já iniciavam os atos executórios para se manter no poder a qualquer custo e neutralizar o controle judicial previsto na Constituição. O ministro destacou trechos que incluíam ofensas à honra de ministros do STF.
“E ainda com ofensas à lisura, integridade de ministros do Supremo. O réu Alexandre Ramagem na mensagem a Jair Bolsonaro diz: ‘Os três ministros do Supremo estão contra a segurança no pleito eleitoral, a evolução das urnas e o estabelecimento de integridade e transparência. Na parte técnica, a urna já está sem credibilidade, assim como o STF’, termina a mensagem”, acrescentou o relator.
Moraes também retomou uma indagação feita anteriormente pela ministra Cármen Lúcia. “Além da desinformação da atitude criminosa, a eminente ministra Cármen Lúcia bem indagou também na tribuna que a organização criminosa confunde, por ignorância ou má-fé, e eu acredito mais em má-fé, o que é voto auditável e o que é voto impresso”, disse ele.
Na ocasião citada pelo ministro, Cármen Lúcia rebateu as falas do advogado Paulo Renato Cintra, defensor de Ramagem. Isso porque, durante sua sustentação oral, Cintra tratou as expressões “voto impresso” e “voto auditável” como sinônimas ao argumentar que o deputado não participou da difusão de desinformação contra o sistema eleitoral.
Na condição de presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), órgão responsável pela organização das eleições, a ministra afirmou com veemência que voto impresso e voto auditável não são a mesma coisa e esclareceu que as urnas são auditáveis desde 1996, quando passaram a ser utilizadas nas eleições.
“Vossa Senhoria usou, com muita frequência, como se fosse a mesma coisa, não é. O que foi dito o tempo todo é essa confusão para criar uma confusão na cabeça da brasileira e do brasileiro para colocar em xeque”, afirmou a ministra.
Após relembrar o episódio envolvendo a correção de Cármen Lúcia, Moraes acrescentou, referindo-se às evidências, que a estratégia não era aleatória, mas sim planejada desde junho de 2021. Ele destacou que o conteúdo dos arquivos digitais apresentava evidente coincidência com os pronunciamentos feitos por Jair Bolsonaro em suas lives e com as anotações no caderno de Augusto Heleno.
Dessa forma, o ministro afirmou haver “total convergência” entre os registros na agenda do general Heleno, as anotações de Alexandre Ramagem e o discurso proferido pelo ex-presidente em suas transmissões ao vivo.
Trama golpista: os 8 réus, o tribunal responsável e o calendário do julgamento
O julgamento da tentativa de golpe de Estado pós-eleições de 2022 ocorre na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), composta por cinco ministros: Alexandre de Moraes (relator), Cármen Lúcia, Cristiano Zanin (presidente da Turma), Dias Toffoli e Luiz Fux.
Os oito réus do “núcleo crucial” são:
Jair Bolsonaro (ex-presidente)
Walter Braga Netto (ex-ministro da Defesa e ex-chefe da Casa Civil)
Paulo Sérgio Nogueira (ex-comandante do Exército)
Augusto Heleno (ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional)
Alexandre Ramagem (ex-diretor da Abin e deputado federal)
Fábio Almeida (ex-assessor especial da Presidência)
Marcelo Câmara (ex-comandante da Aeronáutica)
Almir Garnier (ex-comandante da Marinha)
O julgamento está previsto para seguir até 12 de setembro.
