O ministro negou que o governo esteja criando novos impostos sobre as compras pela internet, o que afetaria milhões de brasileiros. Explicou, porém, que será necessário taxar as transações que hoje driblam os controles de cobrança da Receita.
A iniciativa é necessária, disse ainda, para dar condições de igualdade às empresas brasileiras que têm sido abocanhadas pela atuação das companhias estrangeiros — é o caso das chinesas.
Fim da sonegação
Na prática, não haverá imposto novo, mas as compras podem, sim, ficar mais caras porque o governo tentará acabar com a sonegação — os custos terão que ser absorvidos pelas próprias companhias que vendem, que certamente os embutirão nos preços, ou os impostos terão de ser pagos por quem compra.
Já há algum tempo, a área econômica vem sofrendo pressão de empresas brasileiras para regular o comércio eletrônico, alegando que as gigantes estrangeiras — especialmente as chinesas — têm ganhado terreno com a oferta de preços mais baixos justamente por não estarem sujeitas à carga tributária que pesa sobre o mercado nacional.
Ao ser indagado sobre o tema, Haddad deu uma resposta bastante curiosa. Disse que não conhece a Shein, uma das empresas de e-commerce chinesas que mais têm vendido no Brasil.
“O único portal que eu conheço é o da Amazon, porque eu compro todo dia um livro, pelo menos”, emendou, numa espécie de ato falho — para além de admitir desconhecimento sobre a empresa, em plena China, país que trava uma intensa guerra comercial com Estados Unidos, ele acabou por fazer, ainda que sem querer, uma espécie de propaganda gratuita para a gigante americana de e-commerce.
Não é o único ponto: não deixa de chamar atenção, também, o fato de o ministro da Fazenda do Brasil simplesmente não conhecer uma empresa que, só no ano passado, teve faturamento de R$ 8 bilhões — uma cifra impressionante se comparada às vendas de tradicionais grupos varejistas nacionais.
Haddad contou que, nos últimos dias, uma das companhias chinesas de comércio eletrônico que atuam no país — ele não disse qual — procurou o governo para manifestar interesse em regularizar sua situação.
Eis a seguir os principais trechos da entrevista acerca o tema:
Taxação do comércio eletrônico
“Acho que é mais desinformação do que outra coisa, porque ninguém está querendo coibir o comercio eletrônico. O comércio eletrônico é uma realidade que veio pra ficar. Agora, tem empresas que cumprem a legislação brasileira e tem empresas que não cumprem. E isso você tem que regular porque a concorrência tem que ser leal. A concorrência entre empresas brasileiras e estrangeiras, estrangeiras sediadas no Brasil, estrangeiras não sediadas no Brasil. Há um conjunto de situações em que o papel do estado é garantir isonomia, igualdade de condições de concorrência, para que o consumidor seja o mais beneficiado. E isso não está acontecendo hoje. Corrigir uma distorção não é aumentar imposto, punir quem quer que seja, e nem ter preconceito contra quem quer vender no Brasil. Mas há um pleito que é legitimo de coibir o contrabando. Isso não me parece tão enigmático e controverso assim. São muitas cadeias de loja no Brasil, (há) muito comércio local, inclusive em comunidades pobres, pequenas lojas em comunidades pobres, que fazem chegar o pleito de que, sim, viva a concorrência, o rei é o consumidor, mas em condições de igualdade de competição. A partir do momento em que você não garante essa equidade, você vai destruir empregos e empresas que poderiam continuar prestando um bom serviço para a sociedade brasileira gerando empregos, impostos e um bom atendimento ao consumidor. Não vejo onde está a controvérsia disso.”
O que muda na prática, a chinesa Shein e a Amazon
“Não muda nada. Vocês falam da Shein como se eu conhecesse. Eu não conheço a Shein. O que eu sei é o seguinte: o único portal que eu conheço é o da Amazon, porque eu compro todo dia um livro, pelo menos. Quando você faz as coisas às claras, não tem problema. Se uma sobe o preço e a outra baixa, você vai ter a concorrência em condições de igualdade.”
As chinesas que lideram o mercado
“Já fomos procurados por uma grande dessas dizendo: ‘quero me regularizar, não quero que pareça à opinião pública brasileira, ao governo brasileiro, que eu estou aqui me valendo de um artifício para ampliar minha participação de mercado’. Uma empresa séria não faz isso. Ela quer aparecer com dignidade perante a opinião pública porque amanhã, caso ela se instale (no Brasil), vai gerar emprego. Para que ela vai ficar numa situação de insegurança juridica se ela pode se regularizar sem grande impacto na vida dela? Vai continuar vendendo. Só que a lojinha ali da comunidade, a rede de loja brasilira que é tradicional (também) vai poder. Não vai ser fácil concorrer, mas (a concorrência se dará) em condições de igualdade de competição. Fui comerciante 18 anos da minha vida, trabalhei em balcão, e tudo que queria era que as pessoas tivessem as mesmas condições de competir. A partir do momento em que o sujeito é receptador de carga roubada e o outro é contrabandista, você vai inviabilizando a concorrência. E isso acaba com o comércio, na prática. Um bom comércio é um comercio em igualdade de condições. E não vejo no que isso fira um espírito justo.”