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SAÚDE

Novas tecnologias auxiliam na inclusão de pessoas com autismo e TDAH

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Nos últimos anos, ferramentas para pessoas neuroatípicas têm utilizado o digital para atuar desde no diagnóstico e na comunicação, até no acesso ao mercado de trabalho
Kaique Lima

Nos últimos anos, ferramentas para pessoas neuroatípicas têm utilizado o digital para atuar desde no diagnóstico e na comunicação, até no acesso ao mercado de trabalho

Estimativas apontam que de 10% a 20% da população mundial se enquadra no conceito de neurodivergente – um termo que tem ganhado força para desmistificar quadros como Transtorno do Espectro Autista (TEA), Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) e dislexia, naturalizando-os como parte da diversidade humana.

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A nomenclatura, proposta no final dos anos 90, busca uma maior inclusão dessas pessoas, um desafio que mesmo hoje, mais de vinte anos depois, ainda perdura. Porém, uma série de tecnologias têm surgido para mudar esse cenário, atuando desde no diagnóstico e na comunicação, até no acesso a direitos básicos, como o mercado de trabalho.

“O termo neurodivergente propõe que a pessoa tem apenas um jeito diferente de o cérebro funcionar, que levam a características específicas de alteração na comunicação social e comportamentos. É um conceito que faz muita diferença na forma como essas pessoas são vistas, especialmente na comunidade autista. E para o diagnóstico, o acompanhamento e o tratamento, a tecnologia nos últimos 10 anos evoluiu bastante”, explica a psiquiatra Mirian Biasão, professora da Escola Internacional de Desenvolvimento (EID) e especialista em TEA.

A neurodiversidade parte do princípio de que todos os cérebros são diferentes, existindo os que funcionam da maneira “esperada”, chamados de neurotípicos, e aqueles que apresentam mudanças no comportamento, os neuroatípicos ou neurdivergentes. O termo é amplo, além do autismo, do TDAH e da dislexia, abrange outros quadros que apresentam dificuldades intelectuais.

Nos últimos anos, são inúmeros os artifícios tecnológicos direcionados a esse público, que vão desde uma maior celeridade no diagnóstico, até instrumentos para tornar experiências cotidianas mais acessíveis. Alguns exemplos são plataformas digitais para ligar neurodivergentes a locais de trabalho – e capacitar esses espaços a recebê-los –; projetos que adaptam sites e dispositivos eletrônicos para esse público; aplicativos que facilitam a comunicação de pessoas autistas com dificuldades na fala, entre muitos outros.

Em relação ao diagnóstico, os maiores avanços têm sido para pessoas com TEA. Mirian foi a responsável por um estudo publicado na revista científica Scientific Report, uma das publicações da Nature, sobre a identificação do quadro pelo rastreamento dos movimentos oculares do paciente analisados com a ajuda de uma inteligência artificial. Ela conta que a ferramenta, embora não dispense a avaliação de médicos especializados, teve resultados promissores e possibilita, por exemplo, que pessoas mesmo em regiões remotas consigam receber o diagnóstico adequado e precoce.

No dia a dia, outro ponto em que ela destaca o avanço da tecnologia é para a comunicação de pessoas que têm dificuldades em formar palavras e sequenciar sons de fala.

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“Antigamente nós usávamos uma técnica de comunicação alternativa em que a criança tinha que carregar uma pasta com figuras impressas e ela montava a frase colando as letras ou desenhos. Então imagina o peso dessa pasta a como que você tinha que se organizar para carregá-la. Hoje, isso é feito com um aplicativo de comunicação que além de possibilitar de forma simples a formação da frase por meio das figuras, você tem um botão onde clica e ele emite a fala, o que também estimula a compreensão sonora”, diz Mirian.

Acesso ao mercado de trabalho

Os desafios, no entanto, vão muito além da fase do diagnóstico ou da infância. Neurodivergentes adultos enfrentam dificuldades para acessar algo que é considerado um direito básico para a sobrevivência: uma vaga de trabalho. Porém, existem iniciativas especializadas em conectar indivíduos neuroatípicos ao mercado de trabalho, que têm intensificado a atuação com a ajuda do digital.

A psicóloga Rute Rodrigues, gerente de operações da Specialisterne Brasil, fala que esse crescimento é perceptível, especialmente com a pandemia e o aumento nos postos de trabalho remotos ou híbridos. A instituição, que chegou ao Brasil em 2015, surgiu na Dinamarca 11 anos antes e hoje está em mais de 20 países.

Ela conta que a internet possibilita, por exemplo, que eles ajudem pessoas de estados diferentes em que a Specialisterne não tem sede física e aumentem o alcance do projeto. Hoje a empresa tem escritório apenas em São Paulo e está abrindo um novo no Rio de Janeiro. Mas, Rute conta que, dado o crescimento com a pandemia, o objetivo é ampliar para uma sede em cada região do país nos próximos cinco anos.

“O número de pessoas que nos procura aumentou consideravelmente. Sem dúvidas, esse modelo do trabalho remoto nos ajudou a inserir pessoas de maneira mais expressiva no Brasil. Conseguimos atender uma pessoa que mora por exemplo no interior do Acre, então pessoas que estão mais distantes das grandes metrópoles conseguem ter mais oportunidades de carreira”, conta a gerente.

Além disso, destaca que, numa pesquisa interna, mais de 94% dos profissionais que conseguiram se inserir no mercado com a ajuda da plataforma relataram uma melhora na qualidade de vida – comprovando a importância da profissão para a inclusão de pessoas neurodivergentes, e o potencial da tecnologia para ajudar com esse objetivo.

“A empresa existe para atuar dentro de um problema social existente. Por exemplo, a prevalência de autismo na sociedade é alta, cerca de uma a cada 44 pessoas. E isso se torna um problema quando pensamos que aproximadamente 80% desses indivíduos estão fora do mercado de trabalho, sem uma oportunidade”, diz a psicóloga.

Web para todos

Se o caso da Specialisterne Brasil comprova como a internet pode abrir portas para direitos básicos, dados do Movimento Web para Todos mostram que o simples acesso ao site da empresa ainda pode ser um empecilho a ser resolvido. De acordo com estimativas da organização, menos de 0,5% de mais de 21 milhões de sites ativos no Brasil são acessíveis a pessoas com deficiências severas, conta a idealizadora do movimento, Simone Freire.

“É um cenário vergonhoso considerando que temos um contingente gigantesco de pessoas com deficiência no Brasil. O que não falta é motivo para a sociedade se incomodar com isso, porque isso é um direito constitucional. Temos a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), somos um dos poucos países do mundo que tem uma lei específica para inclusão da pessoa com deficiência. E dentro da LBI temos um artigo, que é o 63, que é para exigir a acessibilidade em páginas web de organizações que estão no Brasil”, afirma Simone.

No caso dos neurodivergentes, ela explica que os maiores problemas são o excesso de informações devido à concorrência para capturar o leitor. Isso leva a grande maioria dos sites a serem poluídos visualmente, com uma enxurrada de que aparecem em diversos momentos na tela, o que pode funcionar como uma verdadeira barreira no acesso à internet por esse público.

“Se trazemos isso pro universo das pessoas neuroatípicas, que interpretam as informações de forma diferente, isso é muito agravado, porque todos esses recursos em excesso podem de fato impedir a experiência de navegação”, diz a idealizadora do Web para Todos.

Por isso, o movimento realiza uma série de oficinas e treinamentos com empresas ensinando práticas para tornar os portais mais acessíveis. Além disso, conduz estudos para traçar o tamanho do problema no Brasil – que hoje abrange a grande maioria dos endereços da web.

No caso das pessoas neuroatípicas, Simone explica que a lógica para facilitar a navegação envolve, principalmente, fatores como multiformato, oferecendo alternativas ao conteúdo como descrição em áudio e em texto. Isso porque cada indivíduo vai ter uma facilidade maior com determinada modalidade, portanto expandir as opções amplia o acesso. Além disso, frisa a importância de conceitos como previsibilidade e controle, bloqueando mensagens inesperadas na tela e criando ferramentas que permitam o usuário decidir o que vai aparecer e em que momento, além de indicar de forma simples onde estão todas as funcionalidades do site.

Para facilitar a leitura

Outro artifício online que busca aumentar a acessibilidade aos dispositivos eletrônicos é a criação de fontes tipográficas específicas para pessoas neurodivergentes. Uma delas, chamada Dyslexie, é uma opção eficaz para auxiliar pessoas com dislexia, apontam uma série de estudos.

O mais recente, conduzido pela Universidade de Lille, na França, em 2015, indicou uma melhora de cerca de 70% para a velocidade de leitura e redução significativa nos erros de interpretação entre aqueles que adotaram a fonte nos textos. A novidade, criada pelo designer holandês Christian Boer, que é disléxico, chegou a ser premiada pelo Smart Future Minds Awards em 2011.

“Cada letra tem uma linha de base clara, que cria um centro de gravidade visual e evita que as letras sejam viradas de cabeça para baixo”, diz a página da fonte sobre o método de funcionamento.

A Bionic Reading é outra opção que tem recebido elogios de indivíduos neuroatípicos. Lançada neste ano, ela pode ser incorporada ao navegador do computador ou utilizada a partir de seu site como uma espécie de tradutor de textos. Ela foi criada pelo designer suíço Renato Casutt e funciona destacando algumas letras no início das palavras para que o leitor não se perca durante o texto.

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Fonte: IG SAÚDE

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